domingo, 6 de janeiro de 2019

Somos nós


O Marítimo voltou a ganhar ontem, quatro meses depois, 17 jogos depois e muitos erros depois, contra uma equipa superior e mais bem preparada, a fazer uso de um bocadinho de sorte em cima de muito sacrifício, muitos nervos e muita falta de confiança, quis o destino que sem o nosso capitão, que se foi embora, e sem o nosso segundo treinador, que ontem não pôde estar no banco.

Foi uma vitória humilde e que saiu da pele, de uma equipa que já não sabia sair do inferno, uma vitória contra tudo, inclusive a própria sobranceria que nos trouxe até aqui, mas ainda mais do que isso, uma vitória de todos os que lá estiveram, de todos os que gritaram e sofreram onde quer que tenham estado, dos que dormiram aliviados, a pensar que uma parte da sua vida saiu dos cuidados intensivos, e de todos os que acordaram um pouco mais felizes por causa disso.

Hoje já me lembrei uma dúzia de vezes que ganhámos ao Portimonense e respiro fundo como no apito final. Haverá muitas contas a fazer a esta época onde a culpa não pode morrer solteira; mas é nos dias piores que se tem a certeza de que há sempre alguma coisa que é Maior do que as nossas frustrações, o nosso desalento ou aquilo que nos separa. E enquanto comungarmos todos desta imensa dignidade que só existe nas pequenas vitórias, feitas do testemunho e do empenho pessoal de cada um de nós, saberemos sempre o que somos e para onde devemos ir.

O Marítimo não é o projecto de poder de ninguém, o Marítimo somos nós, e vamos sobreviver a esta quase tragédia, não pela fé cega em nenhum grande líder, mas pela fé incondicional em cada homem e mulher que se senta e sofre connosco nas bancadas dos Barreiros a cada fim-de-semana, gente que nunca descarta responsabilidades e nunca se vai embora, gente que não tem nada a ganhar, mas com quem já ganhámos muito mais do que perdemos a vida toda.

Isso é o Marítimo. O meu pai, os meus amigos, os conhecidos e todos os desconhecidos com quem já tive a honra de partilhar trincheira, todos os que se estragam genuinamente, todos os que perguntam como correu porque gostavam que ganhássemos, todos os que ficam felizes por nossa causa. Isso é o Marítimo. E enquanto houver gente que saia dos Barreiros a sentir-se Campeã do Mundo porque ganhou ao Portimonense, pois há esperança.

Onde houver um Maritimista, pois há esperança, e haverá certamente esperança até ao fim desta época nua e crua, como no Bessa daqui a uma semana, ou como aquela que levarei comigo aos Açores logo a seguir, de coração cheio com a minha gente, para sermos Campeões do Mundo outra vez, ou pelo menos Campeões das Ilhas, como aprendi em pequenino num dia endiabrado, lá longe. Lá estaremos a dar a cara como sempre, a sofrer como sempre, mas a levar o Leão às costas até onde for preciso, a acreditar por nós e por todos, até ao fim do mar, até ao fim do mundo.

Haverá sempre quem queira levar o Marítimo; o Marítimo é que não vai a lado nenhum. Porque o Marítimo somos nós.