domingo, 4 de março de 2018

ÓSCARES 2018 - Previsão


Que seja a noite de Três Cartazes à Beira da Estrada sobre A Forma da Água, o triunfo do conteúdo sobre a forma, da humanidade singela, e do cinema que fala de gente, sobre a estética tantas vezes presunçosa, vangloriosa e incomunicável.

Isto significa Filme, Argumento Original (para o genial Martin McDonagh) e Ator Secundário (onde nem quero ouvir falar de um Willem Dafoe invisível, perante Sam Rockwell e o papel de uma vida), mas significa, sobretudo, a Senhora que definiu o que era a medida da excelência para todas as outras almas do ano. Frances McDormand é a estrela da noite, é não só o Óscar mais garantido, como o mais merecido, e é, no fim de contas, a melhor notícia que podíamos ter, em tempos tão incertos e traiçoeiros, pela valorização do que é o talento e a experiência, e pela glorificação do que é um filme com pessoas lá dentro. McDormand foi mais do que uma personagem e, no cinema como na vida, é sempre mais especial se for de verdade.

Numa noite para eternizar velhos caminhantes, o monumental Gary Oldman chegará, finalmente, ao primeiro Óscar da carreira, numa performance imortal e num retrato especial, que honestamente me disse muito, me fascinou e inspirou, e que não tenho dúvidas foi dos mais subvalorizados do ano. Como ao próprio Churchill, será o tempo a fazer justiça à Hora Mais Negra. É sempre ingrato falar de concorrência perdida, mas a vitória do velho Oldman será absolutamente valorizada por duas outras interpretações singulares, uma em cada ponta do espectro: por um lado, a explosão de um prodígio chamado Timothée Chalamet (Chama-me pelo Teu Nome); por outro, a despedida do maior de todos os tempos. Vale a pena acreditar que não seja para sempre, Sir Daniel Day-Lewis.

Como sempre, em noite de Óscares, tem de haver lugar ao idealismo e às apostas cegas, pelo que também é hora de atirar unicórnios. Serão, à primeira vista, categorias fechadas, mas se uma única for disputada, então já ganhámos todos qualquer coisa. Começo por Actriz Secundária, onde Allison Janney (Eu, Tonya) é para lá de favorita, com Lesley Manville (A Linha Fantasma) a correr por fora. A beleza é mesmo esta, porque por mim não era uma, nem outra, ainda que Janney seja uma boa vencedora. O meu Óscar ia inteirinho para Laurie Metcalf, única forma humildemente condigna de celebrar uma pequena pérola, que foi a maior surpresa do ano: Lady Bird.

Do benefício da dúvida, passamos para uma questão de justiça e para o esvaziamento definitivo do filme mais desproporcional do ano. Isso implicaria, claro está, resgatar o Óscar de Melhor Realizador para Paul Thomas Anderson (A Linha Fantasma), tirando-o literalmente das mãos de Guillermo del Toro (A Forma da Água), que já é o vencedor oficioso. Muito sinceramente, é mais uma vitória oficiosa incompreensível, porque parece-me evidente que Thomas Anderson apresenta, de longe, o melhor trabalho do ano, com uma verdadeira obra-prima de alta-costura. Todavia, estaria até disposto a ser ainda mais inortodoxo e a pagar para ver uma fantástica oportunidade de partir pedra, reconhecendo, porque não, a delícia do trabalho de Greta Gerwig (Lady Bird), em mais um filme que cometeu a indubitável proeza de falar de relações como se elas não tivessem nada de sobre-humano.

Para o fim, fica um clássico pessoal, de tão redundante, uma mistura entre uma categoria favorita (Argumento Adaptado) e o melhor argumentista que já viveu. Aaron Sorkin voltou em força e Molly's Game é uma maravilha de cinema-espectáculo, vertiginoso, contagiante e sedutor, daquele que nos arranca da rotina e nos leva consigo a viajar. Call Me by Your Name, o favorito, é um dos filmes que marca o ano, mas não precisa deste ponto de honra.

Da alta roda da temporada, só não vi o Get Out, e tenho pena de não "conseguir" redimir com um prémio uma peça tão admirável como The Post. Consegui, ainda assim, voltar a acompanhar a corrida como já não o fazia há bons anos e a melhor notícia é que este foi verdadeiramente um ano bom. Mais logo, lá estaremos para a luta, como sempre.

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