Foto: André Gonçalves
No próximo domingo, dia 22 de setembro de 2019, a Região Autónoma da Madeira poderá ter, pela primeira vez em 43 anos de Democracia, um Governo que não é governado pelo Partido Único.
Não sei se já toda a gente parou para pensar no tamanho deste abismo da História que tem à sua frente. No próximo fim-de-semana, daqui a menos de quatro dias, todos os madeirenses, pais e filhos, homens e mulheres, avós e netos, terão nas suas próprias mãos, num ato tão gloriosamente singelo como o do sufrágio universal, a oportunidade mais real da nossa vida para garantir, pela primeira vez, uma alternativa democrática no governo desta terra.
E o que raio é a democracia, se não a alternativa? Se não a ideia de que é legítima a governação de qualquer homem, venha ele de onde vier, desde que eleito em igualdade de circunstâncias? O que é a democracia se não a ideia de que nenhum poder absoluto é legítimo? Nenhum partido pode ficar no poder 43 anos seguidos como se isso fosse normal, razoável ou, sequer, remotamente são. Reiterar isto, por mais básico que seja, é tanto mais extraordinário se pensarmos que na Madeira nunca houve igualdade de circunstâncias, e por isso nunca houve alternativa: porque as pessoas, adormentadas, enganadas ou mesmo coagidas, aceitaram a ideia de que não podia haver.
Até hoje, a democracia no Governo Regional da Madeira é isso: é a premissa, que o PSD continua incrivelmente a defender até hoje, no ano 2019, de que não há, nem poderá nunca haver alternativa. A democracia na Madeira foram, por isso, 43 anos de poder absoluto sobre poder absoluto, de um enorme monstro que se alimentou a si próprio e sufocou tudo à sua volta, socorrido do mito das “eleições ganhas”, como se num casino a casa não ganhasse sempre. Qual é a legitimidade de tanta maioria absoluta do regime, quando sabemos que as eleições do PSD foram, historicamente, a vitória do nosso atraso sócio-cultural, a vitória do betão sobre a educação, a vitória do culto do chefe e do partido-Estado, a vitória dos empregos da máquina e das obras megalómanas para os amigos, a vitória da perseguição e da descredibilização de quem pensa diferente, a vitória do medo.
O mesmo medo que o PSD continua a instigar, 43 anos depois, com as mesmas fórmulas bafientas de qualquer cacique, as mesmas mentiras e o mesmo vale-tudo constante, a mesma insuportável e insuperável prepotência de uma casta que acha que é ungida por deus, e que segreda às pessoas que o inferno desce à terra se o PSD descer à terra, que a ilha afunda, o mar acaba, que vamos ser todos Cuba e a Venezuela, que vão todos perder o seu emprego, o seu salário, o seu tecto e o seu prato de comida, quando os socialistas, comunistas, bloquistas, esquerdistas, anarquistas chegarem ao poder para lhes devorarem as criancinhas. Porque não há alternativa ao saber, aos quadros e à experiência de um partido cujo único know-how em meio século foi investir na sua própria sobrevivência, à base do atraso humano e pensante dos madeirenses, porque um povo amarrado a não pensar pela própria cabeça, é um povo que nunca vai ser perigoso, porque um povo ameaçado, é um povo que não ameaça.
Isto não é uma piada, é a dialéctica do PSD Madeira, ou melhor, é uma piada que já nos custou muito caro e que hoje, mais do que nunca, nos devia envergonhar a todos. Este PSD é a carcaça que sobra de um regime falido e esgotado, que já não tem por onde fugir. Ouvir Albuquerque dizer que vai pavimentar florestas “quer queiram, quer não”, que vai fazer campos de golfe em promontórios, “quer queiram, quer não”, que as alterações climáticas não existem, enquanto se desmantelam leitos de ribeiras inteiras, já é só humilhante, como será quando ele disser que também quer construir um túnel até ao Porto Santo, a ver se é desta que tem uma overdose de betão, paga com dinheiro público, como de todas as outras vezes.
O Presidente do PSD é um homem doente, rodeado de demagogos febris, cegos e incendiários, que continuam a achar que o partido é uma entidade plenipotenciária qualquer, e resta o dó de constatar a forma como o PSD parou mesmo no tempo, vociferando cartilhas empoeiradas de qualquer ditadurazinha de algibeira, e deixando-se ficar, no limite da sua demência, a brigar contra os inimigos imaginários, ou a República, a ver se, ainda hoje, os iscos de pão, berros e circo são suficientes para enganar um povo humilde, que sucumbiu a tanta década de chantagem, porque esta é uma terra de vidas sofridas e difíceis o suficiente, para ainda ter de suportar tanto medo assim.
Mas 43 anos são muitos anos, até para ter medo.
Pode ter demorado 43 anos, mas a Democracia chega sempre a tempo e hoje, felizmente, há alternativa na Madeira.
E se há, é graças aos próprios madeirenses que, tal como em tantos outros momentos dos seus 600 anos de História, foram capazes de ultrapassar todas as suas espectaculares contingências, seja a rasgar pedra, o mar, ou os seus próprios fantasmas, até darem a volta por cima, e terem melhores condições de vida para si e para os seus, e terem, afinal, o direito a sonhar que é sempre possível ser um pouco melhor, por piores que sejam as nossas circunstâncias. Que é sempre legítimo viver com esperança no que pode ser o amanhã.
Não sei se já toda a gente parou para pensar no tamanho deste abismo da História que tem à sua frente. Mas hoje, 43 anos de Democracia em 600 anos de vida depois, a Madeira tem alternativa porque os madeirenses tiveram, como sempre, a coragem de fazer por isso. O PSD é a cruz que nos calhou um dia; mas o futuro é, definitivamente, fazer o que ainda não foi feito. O futuro não é chantagem, nem prepotência, não são as elites bacocas, nem as negociatas do regime, não é a emigração, nem a falta de educação, de saúde, nem de oportunidades, o futuro não é o medo; o futuro é a esperança de mudar para melhor, de ter uma governação humanista e progressista, educadora, moderna, inteligente e sustentável, de que nos possamos orgulhar aqui dentro e lá fora. O futuro é uma autonomia de resultados, uma insularidade de sonhos, uma ultraperiferia de ideias e de soluções e de globalização, com melhor qualidade de vida, e sanidade democrática de primeiro mundo. O futuro é a busca pelo que esta gente merece, toda a gente, cada um de vocês, e não o quinhão a que aqueles que se julgam donos da Madeira nos condenaram.
Em democracia, não há governos de partido único para a vida toda e é doloroso ainda ter de lembrar isso hoje. Mas se nunca tivemos coragem para fazer diferente, nem engenho, nem oportunidade, há quem tenha tido coragem por nós, e é por isso que agora temos a responsabilidade de retribuir, porque há momentos na vida em que temos a responsabilidade de estar à altura daquilo que gostávamos de ser. Este domingo, não se conformem, não se escondam, não se desculpem, não fraquejem, não falhem àquilo que sabem que está certo e que precisa de ser feito. O voto necessário não é num homem, nem sequer num partido, é um voto na vossa própria consciência. Um voto que prove que há sempre alternativa e há sempre esperança, que honre que mesmo na noite mais triste, em tempo de servidão, há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não. Domingo é a vossa vez. É a vez de serem vocês a resistir. É a vez de serem vocês a mandar.
Se o Paulo não está preparado para governar a Madeira, nunca ninguém estará. Ele não teve medo. Agora é a nossa vez. A alternativa ao medo somos nós.
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