quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Logan: os heróis também merecem jubileu


Haverá, necessariamente, um filme para quem cresceu com X-Men e outro para quem não o fez, como em quase todas as sagas. Ainda que sejam os dois bons, essa será, porventura, a diferença entre ver Logan como um dos marcos do ano e reconhecê-lo - se é que isso é dizer pouco - como um filme de super-heróis acima da média.

Apesar dessa não ser uma média alta, engana-se quem acha que é fácil cumpri-la. Os exemplos disso mesmo são, de resto, incontáveis. Foi sempre difícil fazer filmes substanciais de super-heróis, pela forma, pelo contexto e pela audiência. O mérito de Logan é, por isso, e desde logo, o seu grande orgulho próprio. É um filme com propriedade e com identidade, que não deve nada a ninguém, um filme com um estatuto moral notório, que fecha um ciclo sem pedir licença, nem tentar agradar. Passará muito por aí a histórica nomeação ao Óscar de Melhor Argumento Adaptado (crédito, entre outros, para James Mangold, que escreveu a short story e também realiza), a primeira de sempre da Marvel para as grandes categorias e apenas a segunda jamais concedida à banda desenhada, depois do imortal Óscar póstumo ao Joker de Heath Ledger, em The Dark Knight.

Apesar da excelente atitude, se desprovido da componente emotiva, ou militante se quisermos, Logan não é um filme que surpreenda pela mensagem (nem há sequer comparação possível com os Batman de Nolan, ou até com Watchmen), nem pela abordagem, que chega a ser exageradamente gratuita, com matança desproporcional, em quantidade e em duração de cenas, o que é tanto mais discutível porque dava a sensação de que não era preciso ter ido tão ostensivamente por aí.


Para o bem e para o mal, Logan faz o caminho à sua maneira, e acaba por ter duas grandes ajudas. A primeira é o cenário distópico e o ambiente poderosamente pesado, que nos absorvem desde a primeira hora. É um filme tão árido como algumas das suas paisagens, genuinamente triste e martirizado, e isso graças a uma narrativa que sabe capitalizar o ambiente e que é, sobretudo, firme no sacrifício que lhe emprega.

O verdadeiro trunfo é, contudo, o carisma fundamental das duas personagens principais. Hugh Jackman é tão auto-destrutivo quanto inesgotável, tão intratável quanto disponível, e impressiona a forma como, mesmo contra a vontade, vai resistindo por instinto à sua inevitável degradação. Patrick Stewart é, todavia, e para mim, o maior expoente emocional do filme. Desde a brutal primeira imagem que temos dele, de ir às cordas, até à forma extraordinariamente graciosa como eterniza a sua boa vontade, a sua consciência e o seu toque redentor, mesmo por entre todo o seu tormento. É dele a minha cena favorita ("This was, without a doubt, the most perfect night I've had in a very long time") e, se dependesse de mim, teria trocado sem hesitar a nomeação para Argumento, pela indicação a Melhor Actor Secundário.

É por causa de cada um deles que, mesmo para quem assiste ali ao filme pelo filme, e não a um tributo a uma História muito maior, é impossível ficar indiferente. Logan podia ter sido muitas coisas, algumas melhores, outras bastante piores, mas no fim, foi fiel ao seu ADN, ganhou e perdeu com as suas próprias regras, e com as suas próprias garras, e é por isso que merece respeito. Quase 20 anos depois da primeira vez, Jackman e Stewart despedem-se com a sensação de dever cumprido e com o seu próprio lugar na memória e num Olimpo do tamanho da velha Mansão, aonde todos voltaremos sempre, de uma forma ou de outra.

7/10

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