Até se chegar à Faculdade, Bolonha não é mais do que um nome. Mais uma ideia qualquer para apresentar trabalho de quem não sabe o que é uma sala de aula. Mas só isso, mais uma, para uma geração que apanhou de tudo, das aferições às globais, e que por isso aprendeu também a não estranhar facilmente. Ouvimos falar mal do Processo, coisa nova, mas nem lhe ligamos assim tanto. Eu, pelo menos, não ligava. Achava até que gerava o alarido normal para qualquer coisa que ainda agora tinha chegado, o barulho do costume, mas que num piscar de olhos se ia instalar e noutro nunca mais ninguém voltava a falar dele. Talvez por nunca ter querido saber, é que ainda fui dos que chegou à Faculdade a pensar que aulas eram as que me apetecessem.
Afinal não, Bolonha não é uniformizar os cursos a nível europeu, incentivar a formação e a mobilidade dos cidadãos e fazer crescer as oportunidades. Bolonha é, na pele e na sua verdadeira essência, ter de ir a três quartos das aulas sob pena de chumbarmos inapelávelmente, é andarmos a perder horas e a morrer de tédio para podermos assinar folhinhas e dizermos presente. Porque passar duas horas a ouvir falar de sociologia, numa disciplina de investigação, num curso de jornalismo, com vontade de dar um tiro na cabeça e a escrever textos como este em vez de estar a tentar fazer um esforço sobrehumano para perceber o que é que há de matéria num monólogo de 120 minutos sobre nada, é infinitamente mais produtivo do que estar noutro lugar qualquer a tentarmos fazer qualquer coisa útil, a tentar viver um bocadinho. Porque o que Bolonha veio trazer de novo, foi passar a tratar gente a quem a sociedade reconhece maioridade, gente que, em muitos casos, aos 18 anos tem de fazer as malas e se fazer à vida se quer ter uma oportunidade para se formar, como criancinhas de creche que, apesar das estratosféricas médias de entrada, não têm capacidade para distinguir quais as aulas que prestam e quais as que não. O que Bolonha veio trazer é ridículo e impensável, é desesperante na verdadeira acepção da palavra, e só tem como resultado prático permitir a um punhado de incompetentes apresentar a sua folha de serviços, porque caso contrário teriam as salas, pura e simplesmente, vazias. Talvez seja por isso que pagamos o que pagamos de propinas.
Que fique claro que não ponho em causa, em circunstância alguma, a dedicação ou o gosto pelo que fazem, até a sua condição de pessoas, de boas pessoas. O problema é que, como em tantas outras coisas não vida, para ser professor, ainda por cima no escalão mais alto que essa profissão pode proporcionar, não basta (não devia, pelo menos, bastar) ter boa vontade. É preciso ser bom. E desconfio que, antes de Bolonha, essa distinção ficava até bastante clara. Portanto, ao contrário do que se andou a gritar ontem, não acho que Bolonha seja uma vergonha. Acho, sinceramente, que é muito pior que isso.
Sem comentários:
Enviar um comentário