segunda-feira, 18 de novembro de 2013

A Gaiola Dourada. Nem tudo o que luz é ouro


Tem exibido orgulhosamente o rótulo de sensação do ano em Portugal e não é para menos. Desde a estreia, no Verão, que A Gaiola Dourada se tem assemelhado a um fenómeno de culto, com números que falam por si: 750 mil espectadores até agora e o filme mais visto no país desde Avatar, há 4 anos atrás. Com espaço para gostar mais ou menos, a fórmula parecia inatacável.

Mesmo que talvez não nesta escala, acho que o sucesso é natural. O filme, que não é propriamente refundador, teve o mérito de entrar nos circuitos certos e, sobretudo, de capitalizar de forma magnífica o seu lobby positivo. Ao ser capaz de chegar a um certo patamar de aceitação popular, o efeito avalanche passou a ser uma consequência compreensível. Curto, ligeiro e a explorar uma das linhas matrizes da identidade nacional no último século - a emigração -, A Gaiola Dourada tornou-se num jackpot não por aquilo que é mas, essencialmente, por aquilo que representa. E isso, digo-o sem ponta de condescendência, consigo respeitar. Diria que, em Portugal, toda a gente tem emigrantes na família e esse factor emocional diz muito às pessoas, e funcionou por si próprio a congregar simpatias. Numa avaliação honesta, contudo, é impossível branquear o quão fraco aquilo é.

Não escrevo isto com particular gosto ou só por criticar um produto tão popularizado, mas A Gaiola Dourada é um filme absolutamente mau. Não tem comédia, sendo um deserto de narrativa sem dois segundos de piada; é desesperante quanto à caracterização do contexto e das pessoas, e não consegue ter uma única boa personagem (salvo conduto à beleza da luso-francesa Bárbara Cabrita); e, o mais grave de tudo, não tem pingo de alma. É um filme baço, que começa e se esgota no seu inefável populismo bacoco, que, em vez de gracejar e interpretar as idiossincrasias, reduz a uma caricatura parola e ultrapassada uma comunidade inteira.

Se era essa a intenção do realizador? Claro que não. Ruben Alves é um luso-descendente, que usou as fórmulas com boa-vontade, numa homenagem aos próprios pais. A verdade, infelizmente, é que o seu falhanço é grosseiro. A injecção incontinente de clichés, do bacalhau às bandeiras e aos terços, do benfica aos pastorinhos, à porteira e ao pedreiro, até ao desenlace baboseirão com o fado, são apontamentos tão elegantes como enfiar uma faca pelo ouvido. Um filme destes tinha a obrigação, ainda por cima com o background sentimental de quem o fez, de ilustrar as coisas com coração, graça e o seu quê de brilho. Quando um artista interpreta a realidade através do seu trabalho, tem de tratá-la, tem necessariamente de revelar talento para desconstruir valores e plasmar mensagens, tem, em suma, de saber cativar a audiência para a história que está a contar. À parte o argumento miserável, o único legado de A Gaiola Dourada é, pelo contrário, estigmatizar de uma forma profundamente ridícula tudo aquilo que era suposto celebrar em quadro.

3/10

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