sábado, 16 de novembro de 2013

To the Wonder. Malick ressacou a obra-prima


A minha relação com Terrence Malick é recente e é uma daquelas intensas que parece, ao mesmo tempo, condenada à turbulência. Não o conhecia quando, em 2011, fui engolido pela majestade inenarrável de Tree of Life. Um tipo de filme que eu nunca gostaria, com uma narrativa profundamente desestruturada, uma liberdade inventiva sem limites e um indiscutível egocentrismo do seu criador. O filme, porém, esmagou-me; é que, mesmo donde menos se espera, somos quase sempre capazes de reconhecer uma obra-prima quando a vimos. Como é natural, a curiosidade adensou-se desde aí, ainda que assente na desconfiança de que, em virtude do seu processo criativo, a veneração fosse sempre coisa volátil. To the Wonder veio confirmar isso mesmo.

A nível de alcance visual, o trabalho continua a ser de excepção, exponenciado pela fotografia sempre monumental de Emmanuel Lubezki. Malick tem um dom geoestratégico, e a escolha dos seus lugares e dos seus grandes planos não é menos do que um catálogo de chapas de cortar a respiração, feitas exactamente à medida dos seus tratados filosóficos. A banda sonora, na mesma linha, continua incapaz de desiludir. O traço mais distintivo da sua filmografia é, contudo, o gosto pelo risco e, paradoxalmente, esse é tanto a sua maior bênção como a sua grande maldição. Não me lembro de outro grande criador que seja tão pouco linear nos seus projectos, num tom arrogante e superior que ele nunca tenta sequer disfarçar. Se talvez é dessa forma que se fazem as coisas maiores, é igualmente assim que se falha mais do que a média. Respeitando a doutrina, é inevitável reconhecer que To the Wonder é um filme insuficiente.

Uma narrativa totalmente sinuosa, quando não tem um organismo forte a sustentá-la, é como um vírus que devora tudo o resto. Neste caso, isso acontece porque o filme (quase sem diálogo, como o anterior) é largamente deficitário no argumento, sendo este pretensioso e superficial, e nunca subtil, capaz de canalizar um raciocínio ou gracioso a passar a sua mensagem. A sua total inaptidão para agarrar o espectador e a sua tamanha falta de coesão fazem com que suportar as suas duas horas seja semelhante a um castigo.

Os filmes de Malick não dão muito espaço à interpretação, mas, mesmo assim, Olga Kurylenko destacou-se pela positiva e foi o que de mais genuíno ali houve, tão comprometida que esteve com a essência do filme, ao ponto de parecer emanar dele, física e emocionalmente. Também Javier Bardem, apesar do tempo de ecrã reduzido e da personagem ter sido mal levada, marcou pontos positivos. Já Ben Affleck, e como quase sempre, foi uma folha em branco.

To the Wonder tem algumas madeixas interessantes mas, no cômputo geral, é claramente um filme que não funciona, só passível de satisfazer um punhado de fãs de culto.

5/10

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