"I have no choice but to direct my energies toward the acquisiton of fame and fortune. Frankly, I have no taste for either poverty or honest labor, so writing is the only recourse left for me." Hunter S. Thompson
sábado, 13 de janeiro de 2018
The Shape of Water: quando a fantasia nos distancia
Ponto prévio: tudo o que escrevo sobre The Shape of Water deve ser lido à luz de uma diferença criativa por vezes inultrapassável quando o tema são filmes de fantasia. Guillermo del Toro é um (o) fantasista por excelência e não tenho dúvidas de que quem faz o seu género, será naturalmente tocado pelo filme, pela sua decoração e pela maneira como ele o propõe.
Começo, contudo, por confessar o mais primário: The Shape of Water pode ser exemplar para o seu público-alvo, mas não demonstra capacidade para ir muito para além disso, nem engenho para quebrar determinadas barreiras de forma e de linguagem, que o tornassem numa peça mais subtil, dialogante e, quiçá, universal. O filme conta a história de uma contínua muda, a trabalhar em instalações classificadas do Governo americano na década de 60, e a forma inteiramente inortodoxa como se apaixona por uma das criaturas ali em cativeiro. Pese todo o secretismo, o filme não faz, contudo, segredo disto muito tempo. O que acontece é, aliás, o contrário, e o espectador não tem nem tempo, nem sequer estímulo para digerir a proposta, nem para tentar que ela vagamente nos seduza.
A acção precipita-se, desde cedo, de forma extemporânea, ao bel-prazer de Guillermo del Toro que, não tenho dúvida nenhuma, faz um filme verdadeiramente entusiasmado para si próprio, queimando as linhas entre criador e fã. Já li (como elogio) que The Shape of Water coloca o mexicano no auge da sua liberdade criativa, de forma quase inacompanhável, o que se percebe sucessivamente em cenas quase abstractas, que deformam a própria narrativa, ao jeito de uma miríade de pinceladas febris. Esse descomplexo só acaba, todavia, por aumentar a distância para o espectador, em vez de convidá-lo a aproximar-se, e de uma forma quase irremediável.
A própria humanização dos monstros, que lhe é tão querida, e que traduz o combate ao preconceito por parte de todos aqueles que são diferentes e marginais na sociedade, por mais que represente um propósito notável, fica presa numa narrativa que é muito mais romantizada, e científico-ficcionada, do aquilo que seria necessário. Porque a humanização de um filme é necessariamente a sua capacidade para contar uma história que possamos assimilar, onde possamos ser nós a unir os pontos e a decantar uma moral maior e que nos diga alguma coisa, seja qual for o grau da metáfora, e mesmo que lá estejam todos os monstros do mundo.
The Shape of Water é um filme visualmente bonito, bem realizado e com protagonistas a boa altura, neste caso Sally Hawkins, se calhar o único ponto em que o filme consegue ser eficaz de maneira inortodoxa, e Michael Shannon, na sua austeridade mecânica de sempre (o resto do elenco nem tanto). Só não é um filme onde seja possível entrarmos, darmos alguma coisa de volta, nem chegarmos juntos a lado nenhum, depois de duas horas a viajar num onirismo alheio, muito próprio e muito distante.
6/10
Etiquetas:
Cinema,
Drama,
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Sally Hawkins
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