Carlos Carvalhal já não é treinador do Marítimo. O técnico abandona o clube depois da derrota nesta jornada frente à Naval (1-2), e quando o Marítimo soma cinco pontos em seis jornadas da Liga.
in Maisfutebol
Há 3 anos, Carvalhal ganhou a Taça da Liga. Na mesma época, levou o Setúbal à UEFA com um dos orçamentos mais baixos do Campeonato e, um par de anos antes, levou o Leixões, na altura mergulhado na 2ªB, à final da Taça de Portugal (qualificando o clube, impensavelmente, para a UEFA do ano seguinte). Também é verdade que falhou no Belenenses e, principalmente, no Braga, clubes com mais condições e onde, pela lógica, deveria ter maior facilidade em materializar o seu trabalho. O que não o rotula necessáriamente seja do que for.
No Marítimo, os números foram claros: 2 vitórias em 18 jogos oficiais, razões, a seco, mais do que suficientes para fazer rolar a cabeça de qualquer treinador. Podia argumentar que, a entrar em Março e sem ter tido, como é óbvio, uma única palavra a dizer sobre o plantel, seria muito injusto lhe imputar responsabilidades, e que, ainda assim, em termos de produção de jogo, a equipa subiu muito em relação aos tempos do Lori Sandri. Podia ainda dizer que a equipa foi claramente prejudicada em Braga e na choupana, jogos que poderiam ter mudado muita coisa e que, já este ano, a derrota nos Barreiros com o Braga é fruto dum penalty fantasma. Nada disso mascara, contudo, o essencial. Apesar de ser um admirador do Carvalhal e de ter sido um entusiasta da sua chegada, admito que ele já não tinha condições para continuar. No fundo, foi muito pouco 1 vitória em 11 jogos na época passada, como é muito pouco 1 vitória em 7, nesta. Além de que é difícil engolir que, ao fim de 3 meses, um plantel com a qualidade do do Marítimo não tenha uma equipa, que se empate com o Trofense, se perca em casa com a Naval, se leve um banho do Braga e se perca na choupana com um nacional a jogar meia parte com 10. O Carvalhal falhou mais do que devia, e é óbvio que tem culpa disso. O que não o torna um mau treinador, muito menos garante que a mudança vá mudar tudo. É que o problema do Marítimo é muito mais fundo, e o Carvalhal não é nenhuma excepção. Ele foi só mais um dos que, na última década, teve a infelicidade de passar pelo Marítimo. Só mais um dos que falhou, dos que saíram pela porta pequena.
Vou aos Barreiros há 10 ou 11 anos, e só conheci um presidente: o Carlos Pereira. Digo, sem desvalorizar, que o Marítimo lhe deve muito, porque nos salvar da falência para nos tornar capazes de pagar do próprio bolso um centro desportivo, não é coisa que se esqueça. Contudo, não é só disso que se viveu na última década. Infelizmente, a acompanhar a gestão patrimonial, esteve quase sempre uma gestão desportiva absolutamente ruinosa e isso, num clube de futebol, não pode ser nunca um segundo plano. Pelo menos, não no Marítimo. Nas últimas 7 épocas, o clube teve 11 treinadores, plantéis refeitos, quase do zero, permanentemente e, com um orçamento sempre entre os 5 ou 6 maiores do campeonato, só se qualificou 2 vezes para a UEFA. Pior do que tudo isso, o clube sofreu um esvaziamento humano arrepiante. Subimos pela primeira vez em 1978, fomos à UEFA pela primeira vez em 1993, e, nesses anos, mesmo sem apoios do governo, sem orçamentos chorudos, sempre fomos o clube do Caldeirão, do estádio cheio, o clube que era a bandeira de uma região, o clube do povo. Hoje, com o governo regional imiscuído numa SAD inócua e ridícula, com um rival a dar sinais gritantes de maior competência desportiva, somos o Marítimo que já não consegue encher meio estádio dos Barreiros. Somos o Marítimo que faz casas de 2 mil e tal pessoas, o Marítimo que cada vez diz menos às pessoas, o Marítimo que recebe os três estarolas para encher a Central de adeptos deles. Somos o Marítimo que perdeu as referências, que se converteu num enorme negócio, o Marítimo que jogou de azul e amarelo na Luz porque o governo regional quis, o Marítimo que vai ter um estádio novo azul e amarelo porque o governo regional quis. Somos o Marítimo que já não mete medo a ninguém, o Marítimo que se tornou numa piada, o Marítimo que, no fundo, já não é o Marítimo.
É estranho olhar para o Braga, um clube com as mesmas condições, o mesmo dinheiro, o mesmo potencial regional, e ver os resultados estrondosos, o método, o projecto. Ver a incompetência que grassa tanto por cá. Em 7 anos só tivemos dois treinadores verdadeiramente bons, o Cajuda e o Lazaroni, e, para cúmulo, qualquer um deles, depois de cumprir os objectivos aos quais o Marítimo tem sempre de se vincular, foi ESCORRAÇADO do clube, o primeiro porque afrontou o presidente em relação à composição do plantel, o segundo porque reclamou um prémio por objectivos que o presidente nem admitiu negociar. O presidente que come e cala sempre que o chefe do governo regional abre a boca, é o mesmo presidente que converteu o Marítimo numa pequena ditadura. O Marítimo que, nas palavras do próprio Alberto João Jardim, lhe provocou a única verdadeira derrota política na vida. Foi nos Barreiros, a 25 de Maio de 1997. Nesse dia, antes dum jogo do Marítimo, 6 ou 7 mil pessoas apuparam-no em uníssono enquanto subia a escadaria da bancada Central, em resposta à sua intenção de fundir Marítimo, nacional e união num Clube Único da Madeira. E isso ele nunca vai esquecer.
Em 12 anos de presidência, o Carlos Pereira secou o Marítimo. Os adeptos estão afastados, a equipa tornou-se numa piada que vagueia ao sabor do vento, e, neste Marítimo, já nenhum treinador tem verdadeiramente condições para ter sucesso. Não sei se interessa a alguém que o Marítimo seque, se o Marítimo ainda é uma espinha encravada nalguma garganta, nem sei se o Carlos Pereira optou por determinados caminhos pela própria cabeça ou pela de outros. Sei é que, a um ano do centenário, está na hora.
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