quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Clear Eyes, Full Hearts, CAN'T LOOSE


Friday Night Lights conta a história de uma pequena cidade do Texas que vive à volta da sua equipa de futebol americano do liceu - os Dillon Panthers -, sob o ângulo do treinador recém-contratado e dos jogadores, dos seus amigos e das suas famílias.

É uma série absolutamente dual, o que não é muito comum. Por um lado, é magistral ao nível das relações pessoais e da caracterização das personagens. É poderosa nos dramas dos protagonistas, e, tratando sobretudo menores de idade, é admirável no trato da proverbial "perda da inocência" tão americana. Puxa confrontos muito difíceis de ajuizar e nunca é linear, isto é, foge da situação típica de "o bom contra o mau" e dá diferentes perspectivas legítimas, expondo a complexidade da interacção entre casais, amigos, etc. Nesse aspecto é extraordinária. Isso mais uma grande banda sonora.

Por outro lado, é um desastre ao nível da história colectiva. Não tem rasgo nenhum, as perturbações que surgem são más e os desfechos são de uma previsibilidade constrangedora, como se no contrato estivessem estabelecidos um sem-número de finais felizes, depois de situações em que esses eram quase impossíveis, sendo conseguidos com uma jogada milagrosa nos últimos 5 segundos. Mau demais. Um aspecto que pode não ter pesado a favor é o facto da primeira temporada ter uns longos 22 episódios: do primeiro terço para o resto a qualidade cai claramente, apesar de alguns trunfos, novamente ao nível das personagens, na parte final.

A melhor personagem da série é Tim Riggins (Taylor Kitsch), o capitão moral da equipa, um defesa duro que cresceu assombrado pela ausência do pai, a viver só com o irmão. É um auto-destrutivo com queda para o álcool e para bater com a cabeça na parede, mas leal e imprescindível, e que é levado ao nível seguinte pelo carisma de Kitsch.

Depois Jason Street (Scott Porter), o golden-boy, um quarterback predestinado a quem o destino, contudo, prega uma partida. É a personagem mais trabalhada ao longo da trama e essa sua evolução, ou recriação, é um dos grandes focos de interesse. A sua amizade de irmãos e toda a relação com Riggins é possivelmente a chave da série.

Notar ainda o excelente nível do treinador Eric Taylor (Kyle Chandler), no fundo a personagem mais exposta e mais central, que assenta de uma maneira muito genuína como líder daqueles miúdos, como chefe de família e como responsável por um grupo que carrega as expectativas de uma cidade inteira.

Ao nível dos secundários, destacar pelo menos dois: a deslumbrante Tami Taylor (Connie Britton), a mulher do treinador, que com um toque maduro e maternal dá um equilíbrio perfeito ao casal e à série; e Herc (Kevin Rankin), um filósofo numa cadeira de rodas, de quem é impossível não gostar.

Fica a sensação de que para umas coisas contratou-se um argumentista craque, para outras o primeiro que apareceu. É pena. Com densidade na história de fundo Friday Night Lights seria uma obra-prima.

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