sexta-feira, 31 de agosto de 2012

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

É verde-rubro o sonho, do outro lado do mar


A Europa sempre foi o nirvana do maritimismo.

Troféus são outros campeonatos. Ainda sonhávamos com a Taça, mas nada preenchia o nosso imaginário como a UEFA. Jogar com os melhores do continente. Ter aquela vertigem de ir mostrar o Marítimo ao mundo, de estar nos grandes palcos, de jogar onde interessa, onde se faz a diferença.

Cresci com as imagens do Rui Fontes a chorar na tribuna dos Barreiros, em Maio de 1993, quando a equipa-maravilha liderada por um tal de Paulo Autuori se tornou no primeiro clube madeirense a chegar às competições europeias. Com o golo do Paulo Alves ao Aarau, no ano seguinte, que fez com que uma equipa madeirense vencesse pela primeira vez uma eliminatória europeia. Com a bola do Vado à trave, revista no VHS vezes e vezes sem conta, enquanto a geração do meu pai, ainda estarrecida de espanto, se enganava que talvez esse golo pudesse ter derrubado uma tal de Juventus, que tinha o Baggio, o Del Piero e o Ravanelli.

Cresci a acordar cedo para ver o nosso papelinho desenrolado no sorteio da Eurosport, puto a fazer as figas todas para que não apanhássemos um tubarão. E depois a ficar desolado pela forma como nos agigantávamos com os Leeds e os Rangers deste mundo, só para o universo nos virar as costas e fazer-nos perder nos penalties.

A Europa sempre foi o nosso sonho. Do outro lado do mar, ganhar, ganhar, ganhar, como diz o hino. Com mais e menos azares, porém, há muito tempo que a primeira eliminatória nos sabia a pouco.

Ter ganho hoje, chegar finalmente à fase de grupos, é uma emoção indizível. De fora, pode parecer nada, mas, para nós, é um dia em directo para a História. O Marítimo, o grande Marítimo, o maior da Madeira, o Campeão das Ilhas, vai finalmente jogar entre os melhores da velha Europa. Mesmo em crise, e a milhas do dinheiro e das equipas de outros tempos, é desta que vamos finalmente à aventura.

Obrigado ao Presidente, que investiu pessoalmente na campanha. A este grupo impagável de jogadores, que lembraremos daqui a muitos anos. E, acima de todos, ao Pedro Martins. Pensei que nunca ia ver o meu Autuori. Afinal tenho o privilégio de estar a ser liderado por um melhor.

Isto são os nossos títulos. Levar orgulhosamente ao mundo o nome de uma ilha com 250 mil habitantes, bater-se em Anfield, no San Mamés ou em San Siro com o brio do verde-rubro, com as cores dos nossos pais, e dos pais dos pais deles. Ganhar, poder crescer, contribuir para a saúde do futebol português e do país em si. Reviver o Marítimo do Funchal, do Caldeirão dos Barreiros, o Marítimo que se foi perdendo no caminho, mas que continua a não ter igual no coração da Madeira.

O Marítimo que está na casa e no carinho de toda a gente, e que pode voltar a estar na vaidade e na rua e por todo o lado. O Marítimo que só precisa de uma oportunidade para voltar a ser o Marítimo. Uma oportunidade que começou hoje.

Obrigado Leão. 

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Deviam falar do Braga nas escolas


Ninguém precisa que lhe falem de empreendorismo, de competência, de projecto, de fazer bem, de estar à altura, de crescer e fazer-se grande. As pessoas precisam que lhes mostrem. Mostrar o Braga devia ser o ponto 1 do sumário.

Num país tricéfalo, conformado, onde os grandes e os pequenos já nascem assim, onde se sonha pouco, onde escasseia o mérito e sobejam os favores, onde nunca esbanjou a esperança e a vontade de se provar a si próprio, de ser maior e melhor, há o Braga.

Quando comecei a ver futebol, a alguns 15 anos, o Braga nem candidato à Europa era. Hoje é, no pior dos casos, o terceiro clube português com maior expressão internacional. Começou do zero, acordou e não tinha nada, e foi de cabeça, para o que desse. Hoje dá para lutar pelo título e para ter o respeito do Velho Continente.

No Braga tudo sai bem. Mudam treinadores, mudam titulares, e ninguém dá por eles. Conservou-se a matriz, conservou-se a estrutura, conservaram-se líderes de balneário, claro, mas num clube médio, onde o natural era sucumbir às circunstâncias, têm sido sempre as circunstâncias a sucumbir ao Braga. O Braga bateu a sorte e o azar. A margem de erro do Braga é ser mais inteligente, mais avisado e fazer melhor do que os outros. E este Braga já é uma marca, é um monstro em andamento, uma bola de neve, que rola e rola todos os anos, que perde uns, e se engrandece com outros, justamente maior em si, como organismo, do que qualquer um dos seus.

Num país em que não havia lugar para o Braga, o Braga resolveu provar ao país que ele próprio pode ser melhor. Pode crescer, pode ser fresco, pode ser diferente, pode vir de baixo, pode sonhar, pode agigantar-se, e pode bater-se de frente com qualquer um. Basta ser bom, ser competente, dar de si, e querer, genuinamente, ser melhor.

O Braga foi a melhor coisa que aconteceu ao futebol português desde que me lembro. Hoje, contudo, já é mais do que isso. Depois de ver este jogo no Friuli, no corolário dos últimos três anos extraterrestres, falar de futebol já é falar pequeno. Este Braga é tudo o que Portugal devia ser.

sábado, 25 de agosto de 2012

Imortais


Armstrong vai perder os 7 Tours, dizem eles.

Não há como evitar um sorriso. É como as Pussy Riot serem presas por desacatos religiosos. A máquina cospe-nos a coisa, formalmente imbatível, possuída da certeza ingénua de que tem as evidências consigo. Nós, ficamos só a olhar com toda a condescendência do mundo: acreditarão eles mesmo que podem reescrever a História?

Armstrong é o maior que alguma vez vi correr. É, também, o desportista mais controlado de todos os tempos. A perseguição a que foi sujeito, durante a sua estratosférica carreira, foi qualquer coisa de doentio e febril, e ultrapassou todos os limites do razoável. Foram dezenas os furos dos jornais franceses que o odiavam, e os médicos e colaboradores e ex-colegas prontos a acusá-lo, e, no entanto, mais de 600! controlos depois, não lhe conseguiram tocar nem num fio de cabelo, para desespero esganado das suas hordas de inimigos.

Armstrong sempre foi o gigante que toda a gente queria ver cair. Como um verdadeiro gigante, porém, ganhou tudo, foi e voltou, e, mesmo assim, nunca perdeu um centímetro de altitude, nunca deixou de ser inatacável.

Hoje, 3 anos depois do último dia, parecem finalmente perto de lhe roubar as 7 Voltas a França. Porque os cães nunca deixaram de correr desalmados por sangue, porque nunca lhe deram paz, mesmo depois do fim. Nunca lhe perdoaram por ser de verdade num desporto tantas vezes podre, por nunca ter fraquejado, por nunca ter perdido, por ser tão espectacularmente melhor do que eles.

Agora, ou continuava nos tribunais até morrer, ou abdicava dos títulos. Como sempre, fez a escolha certa. As águias não caçam moscas. Lance já provou tudo o que tinha a provar, e fê-lo todos os dias da sua carreira. Depois de lhe tirarem os títulos, quem sabe se os pobres diabos que o perseguem compreenderão que a imortalidade não se perde na secretaria.

Londres tem um novo prodígio


Que era bom, toda a gente sabia. Que, à 3ª jornada, o futebol do campeão europeu fosse ele, provavelmente não.

A entrada de Eddie Hazard na Premier League foi um verdadeiro evento nuclear. Titular desde a primeira hora, o seu peso no jogo da equipa tornou-se, num ápice, avassalador. O Chelsea tem 8 golos, ele fez 4 assistências, ganhou 2 penalties e marcou outro. Tudo lhe passa pelos pés, ou a passear-se na cabeça da área, abrindo o jogo com o requinte do seu toque curto, ou nas suas espectaculares explosões em transição, que deixam os adversários irremediavelmente colados. Tem tanto de técnica como de discernimento e objectividade. Todo o seu jogo é um manual de capacidade e inteligência em movimento, em tudo o que faz parece melhor do que os adversários, um passo à frente, imparável. 

Mesmo ao fim de tão pouco tempo, não parece prematuro dizer que está encontrada uma das figuras maiores desta Premier League.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

New Girl


Uma das descobertas do ano.

Tem vida, cor, e é genuinamente divertida. 1 apartamento, 3 homens, amigos de anos, e a mulher que vai viver com eles. Todos a beirar os 30, todos solteiros e mal resolvidos amorosamente, a esbanjarem química, nas venturas e desventuras das profissões, dos relacionamentos e da vida comum, tudo cruzado no enorme loft que lhes sabe tanto a casa. New Girl é uma série matura e inteligente, sem piadinhas de algibeira, que vive plenamente entre a seriedade e o humor, entre o "drama" da realização pessoal e o prazer da eterna juventude, adulta à sua maneira, e que dá tanto mais gozo por causa disso.

Zooey Deschanel, nomeada a um Emmy e a um Globo de Ouro, é o coração da série, como o próprio nome indica, e uma grande revelação. Não a retive no 500 days of summer, porque não fiquei fã do filme, mas, "a tempo inteiro", não há como não gostar dela. A sua graça, a desorientação, o politicamente incorrecto, a meninice, o ocasional "one of the guys", juntos aos seus olhos azulões e ao seu jeito, tornam-na absolutamente adorável. Talvez o seu non sense não assente em tudo, mas, aqui, é um papel escrito a olhar para ela.

Jake Johson, no principal papel masculino, é o outro trunfo. O tipo com piada, amuo e bom coração, meio galã despegado, e sempre sem dinheiro, trintão e ainda a trabalhar num bar. Max Greenfield, o mais endinheirado, com melhor trabalho mas, também, o mais peculiar, cheio de manias, regras e falta de senso comum, é o melhor secundário, e também foi nomeado ao Emmy.

A série, nomeada ao Globo de Ouro para Melhor Comédia, já tem a segunda temporada garantida. É difícil não gostar.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Fome de bola


Liga a dois. Não que Braga e Sporting não possam correr, mas, no fim, só muito dificilmente a decisão não será entre a dupla do costume, muito mais fartos em meios, em estatuto, e com um passado recente muito pesado para ser ignorado. Entre Porto e Benfica, os favoritos são os campeões em título. Claro que a equação pode mudar se saírem Hulk e Moutinho, mas o Porto tem todas as cartas na mão. Se no ano passado, com todas as suas insuficiências, e com toda a pressão, Vítor Pereira conseguiu cumprir, desta vez o Porto joga de cima desde a primeira hora, e é o rival quem tem tudo a perder. Além disso, o plantel é mais equilibrado do que no ano passado.

O Benfica gastou mais, ainda não perdeu ninguém, mas a gestão de recursos de Jesus continua a ser pavorosa. Basta puxar, por exemplo, a questão dos extremos: com 4 de nível europeu, o clube deu-se ao absurdo de gastar 22M€ em mais 2. Isso mais os reforços non sense cá de dentro, que nunca calçariam, ou começar a época com 9 avançados... quando só joga 1. Ao Benfica continua a faltar método, rigor e humildade, em benefício da ostentação, e isso só pode prejudicar a equipa, ainda por cima num ano que aconselhava a alguma introspecção, uma vez que a cobrança estará, e legitimamente, no limite extremo do suportável.

O Braga é um pouco imprevisível. A lógica aponta para a manutenção do nível dos últimos anos, mantendo-se escrupulosamente a equipa do ano passado, bem reforçada, e a liderança imponente de António Salvador. O banco é, porém, o factor que baralha as contas. Peseiro é um grande treinador em muitas vertentes do jogo, é renomado, mas toda a gente sabe que tem a carreira manchada por um derrotismo crónico. Se estiver à altura, então o Braga jogará naturalmente pela Champions; o problema é que não estar é uma hipótese mais razoável do que seria suposto.

O Sporting viverá a sua situação impossível de sempre. Não tem o dinheiro dos rivais históricos nem a competência do mais novo, mas ser-lhe-á exigido que bata o segundo, e incomode os primeiros, O plantel é muito interessante, jovem, até bem reforçado, mas o onze não é levado a sério (para o que não contribuem saídas aberrantes de titulares a preço de tostões). Sá Pinto merece o benefício da dúvida, mas tem quase tudo a provar, e usufruindo da mesma estabilidade estrutural de um castelo de cartas, a sua missão é mais difícil no Sporting do que em qualquer outro sítio.

Na habitual zona europeia, o plantel mais forte é o do Nacional. A equipa fez um último terço de campeonato brilhante, uma boa pré-época, e mantém o treinador e quase todos, sobretudo a versatilidade do ataque. Perdeu a dupla de centrais, mas vai entrar certamente forte. O Marítimo continuará a ser uma aposta segura. Saíram 4 jogadores importantes, e ainda podem sair mais 2, o que baralha um pouco as contas, mas Pedro Martins dá garantias no início do seu terceiro ano, o grosso da equipa continua, e os reforços foram bons. O Guimarães é a maior incógnita da época. Em virtude do apocalipse financeiro em que o clube mergulhou, abandonaram o plantel quase duas mãos cheias dos seus jogadores mais caros. As entradas, por sua vez, foram absolutamente parcas. O onze titular continua a ser de valor, mas não há rede, e mudanças tão profundas costumam doer. A apostar, contudo, diria que os homens de Rui Vitória vão bater as circunstâncias, e assumir-se como uma das boas notícias da época.

A espreitar da segunda metade da tabela, sobressai a Académica. O plantel implodiu, mas a Briosa pegou forte no mercado, e reforçou-se a condizer com o estatuto europeu. Um plantel novo em folha é sempre um risco, mas o seu é necessariamente dos mais promissores da Liga. Depois, a Olhanense (se vingar a acalmia entre Sérgio Conceição e o presidente) e o Gil, na linha do que já fizeram no ano passado. Ambos viram os ataques trucidados, mas têm plantéis fiáveis, com, pelo menos, dois bons reforços cada, e são muito bem treinados. O Setúbal deverá conseguir sobreviver entre mundos. Não é uma certeza, porque atravessa uma renovação geracional importante, mas soube estar no mercado e, acima de tudo, conta com José Mota no banco.

No oposto, emerge o Moreirense, e de forma previsível, como o plantel mais pobre da prova, e como principal candidato à descida. O Estoril passará dificuldades, mas reforçou-se surpreendentemente bem para as suas condições. De quem segue na Liga, o Rio Ave, o Paços e o Beira-mar deverão completar o leque que decidirá a descida: perderam os melhores jogadores, e não se conseguiram compensar. O Beira-mar terá o pior plantel dos três, mas os vila-condenses e os pacenses têm o ónus de estrear um treinador, os primeiros, no caso de Nuno Espírito Santo, em absoluto.

Está quase.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

A Olimpíada que recomeça


Acabam os Jogos, e o Verão fica irremediavelmente mais pobre. Não há forma mais cristalina de os definir do que este sentimento universal de perda quando eles acabam. Tanta gente não gostará de desporto, muitos mais não os seguirão de papel e caneta, mas não pode haver ninguém que não goste dos Jogos.

As transmissões de manhã à noite, o banho democrático que são as dezenas de modalidades, as provas de manhã antes de ir para a praia, e as finais à noite, depois do jantar, descobrir, numa tarde quente ao sofá, que o ténis de mesa desfaz os nervos, ficar a ver o concurso de ginástica em que tropeçámos, e electrizar com os únicos jogos de vólei, e provas de natação e corridas de atletismo que veremos em 4 anos, com a devoção de um verdadeiro aficionado. Que se seja indiferente ao desporto, claro. Que se fique indiferente a esta universalidade dos Olímpicos, à adrenalina das medalhas nas esquinas mais escusas, à possibilidade do nosso hino, ao Phelps e ao Bolt, à História a escrever-se, tudo 24 sobre 24 horas, como se estivéssemos todos em Londres a viver isto ao mesmo tempo, impossível.

Para nós foram amargos, os piores desde Barcelona, há 20 anos, mas, mesmo assim, deu para medalhar, e pela 5ª vez seguida, prolongando a nossa melhor série de sempre. E ter vibrado como um esganado, às 10 da manhã e ainda de olhos turvos, com a primeira tirada de canoagem que vi na vida, valeu pelo resto.

Se não fossem monumentais, não seriam Jogos Olímpicos, e é sempre um bocado redundante querer achar o que os distinguem. Mesmo assim, arrisco que Londres 2012 lembrarei pela ocidentalidade, por ter sido uma coisa muito próxima, muito europeia nossa, a esbanjar cultura comum. Mas também pelo enorme ambiente, próprio de um sítio senhorial, à medida destas coisas, e pela competência, pelo gosto em estar à altura. E, tão fresca que está na memória, a matriz é mesmo a brutal cerimónia de encerramento, tão genuína e tão fiel a esse património imaterial da Humanidade que é a música britânica. Os nomes, os concertos, o desenho do espectáculo, o Mercury, por deus, a pedir odes ao público, não havia ali nada de mau gosto, tudo o que havia eram razões para pagar bilhete.

Como se não bastasse, o círculo completou-se com a água que fica na boca para daqui a 4 anos, numa miragem tremente de excitação. A juntar à Copa do Mundo, em 2014, o Brasil, e a Cidade Maravilhosa em particular, é a próxima casa dos Jogos, e não há ninguém que, hoje, não tenha sonhado acordado com o Rio de Janeiro que está para vir. Serão os primeiros na América Latina... e, muito especialmente, os primeiros na lusofonia. Os próximos Jogos vão respirar português por todos os poros, vão-nos ter entranhados na pele, e vão fazer parte de nós. Vão ser em casa. No calor, no samba, na cor e no apelo de um Brasil palpitante, que, pura e simplesmente, não se pode recusar. 

É que uns Jogos Olímpicos no Rio não se vão ver; vão-se viver.

sábado, 11 de agosto de 2012

México, uma competitividade singular, e o Brasil que não sabe ganhar


A postura em campo das selecções mexicanas é sempre qualquer coisa de espectacular. Equipas tão talentosas quanto duras, tão capazes de se superarem como de abordarem qualquer jogo avisadas, que dificilmente não cumprem objectivos mínimos, e que nunca vão para casa sem vender cara a derrota. Os mexicanos são um manual de cultura competitiva. Vê-se na seriedade, na maneira de estar, sem pequenez de espírito contra os grandes, sem serem apanhados desprevenidos contra os pequenos. Se a estaleca muitas vezes não dá para bater os maiores, a geração que se sagrou hoje campeã olímpica merece, pelo menos, o benefício da dúvida para os próximos anos: até à final de Londres, foram campeões do mundo de sub17, 3ºs no mundial de sub20, e ganharam Toulon.

Hoje, lavaram autenticamente, e com toda a naturalidade do planeta, a selecção A brasileira. Aversos às insinuações de superioridade, meteram a faca entre os dentes e foram massacrando a super-canarinha. Aos 30 segundos já ela lá morava, e, valendo a verdade, o Brasil nunca foi mais do que uma borrão alegre de malabarismos inconsequentes. Quando Mano Menezes, desesperado, desfez qualquer vestígio de táctica que pudesse ter, os mexicanos tiveram 4 bolas de golo clamorosas em 10 minutos, até terem dado o cheque-mate no jogo. Tudo gerido com uma maioridade desarmante, que deve envergonhar um Brasil de gala, que, no fundo, nunca foi mais do que um conjunto de miúdos, incapaz de se comportar como um vencedor.

Este projecto de Mano Menezes para o grande objectivo de uma era - a mítica Copa do Mundo, que se joga daqui a dois anos - oscila entre o melhor e o pior. Para mim, é sensacional que a Selecção principal da Canarinha se dê ao luxo absoluto de ter, hoje, 15 ou 16 jogadores com menos de 23 anos. É uma vitalidade sem paralelo em mais sítio nenhum do mundo, fruto de uma geração fantástica, que não me lembro nem do próprio Brasil ter, tão massiva e organicamente, de uma vez. Entre o Santos campeão americano, o Brasil campeão do mundo de sub20, e a pujança do próprio Brasileirão, fruto do crescimento económico do país, esta equipa é uma amálgama de certezas, todos a crescerem e a virem para a Europa ao mesmo tempo.

O talento transborda, o futebol flui em campo, e as possibilidades são totais, mas se Mano tem o mérito de ter congregado e investido desde a primeira hora neste conjunto tão jovem, continua sem dotá-lo das vitórias. Também na Copa América do ano passado o Brasil foi a melhor equipa da prova; então, como agora, não sobra nenhum título para contar a história.

Assim, a maldição da Canarinha nos Jogos continua. Pela terceira vez perdeu uma final, e o ouro olímpico continuará a ser o unicórnio do super-Brasil, o único grande título que a melhor Selecção de sempre nunca conseguiu ganhar. Desta vez, contudo, era tangível demais para maldições, e já não haverá nenhum brasileiro que não seja assombrado pela ideia da reedição do Maracanazo na final do Rio, 64 anos depois.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Mea culpa


Revi o Inception, dois anos depois.

Sem a adrenalina da estreia, com tudo pesado, a beber todos os pormenores.

Se calhar é surpreendente, mas fiquei muito mais esmagado do que da primeira vez. Não que o deslumbre não tenha sido instantâneo, mas, então, vi-lhe defeitos a mais.

Não podia deixar passar sem um acto de contrição. Inception é um filme total, monstruoso, só ao alcance de um génio absoluto. Di Caprio é altíssimo. O seu drama pessoal esbanja emotividade. O contrato, em si, não poderia ter nenhuma motivação maior. As pontas da história, que abrem e fecham o filme, são de uma monumentalidade indizível. E o fim é, todo ele, uma obra-prima, é Nolan no seu auge.

Se não o vi da primeira vez, é porque não consegui acompanhar. Devia estar atordoado.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

The Dark Knight Rises


Antes de mais, duas coisas: a primeira é que era virtualmente impossível que TDKR superasse o seu antecessor, simplesmente porque The Dark Knight é o melhor filme de super-heróis de todos os tempos, e foi um magnum opus que não acontece duas vezes na mesma trilogia. E não superou, de facto. A segunda é que Nolan faz filmes bons, muito bons ou excelentes, nunca menos do que isso.

The Dark Knight Rises é muito bom, mas fica a uns palmos da excelência. É ingrato dizer isto de qualquer filme de Nolan, mas é, ao mesmo tempo, dos maiores elogios que lhe posso fazer: o nível é tão alto, que os seus vácuos notam-se mais do que os dos outros. Em TDKR o ambiente gastou, como seria normal. Já todos tínhamos passado duas vezes por aquela Gotham no limite, caótica e possuída por um louco, só que desta vez não houve o glamour do festival do Joker. Depois, a acção prometeu muita coisa, mas teve dificuldade em concretizar, ferida de uma certa inevitabilidade de fim de história, que lhe toldou o rasgo criativo, e a impediu de ir mais longe aqui e ali. Uma linha importante da trama - Miranda Tate (Marion Cotillard) - é francamente infeliz. E, para acabar a lista, foi criminoso ter vulgarizado um fim que foi, até aos últimos fiapos, de altíssimo nível.

Dito isto, reforço que TDKR está à altura de uma trilogia tão brilhante como este Batman de Nolan, o que fala por ele. A grandeza do texto prova-se quase a cada cena. Os dilemas, as teses, os dramas pessoais, as relações, os propósitos, continuam a ser puxados pelos Nolan com uma mestria e um peso sem paralelo neste tipo de filmes. Uma Gotham irremediável, condenada a voltar à guerra independente aos anos de paz; um Batman de joelhos, que perdeu tudo e perdeu o rumo, mas que é incapaz de virar as costas; e vilões humanos, complexos, que a vida, não a psicopatia, precipitou para fins doentios. Além disso, se é que era preciso, Nolan provou-se, uma vez mais, como um colosso do cinema-espectáculo, provavelmente sem rival nos dias que correm, apoiado na gloriosa banda sonora de sempre de Hans Zimmer.

Chris Bale sustentou, uma vez mais com aquele peso do mundo aos ombros tão distinto, um Bruce Wayne morto para a sociedade há 8 anos, morto por dentro e sem razão para continuar. Anne Hathaway cumpriu as expectativas num papel que era a sua cara, como uma Catwoman lasciva mas nunca vulgar, a navegar como free agent. Tom Hardy é um Bane sensacional, digno sucessor do Joker de Ledger, um monstro de força profundamente torturado pelo passado, a quem a vida virou as costas, e que dela se tenta vingar. E, finalmente, o meu Óscar para Secundário era já entregue a Michael Caine. O Alfred ancião e venerável, mais mortificado do que nunca por aquele filho que nunca teve, e que rouba, possivelmente, as duas melhores cenas do filme, a última, então, de deixar um imenso nó na garganta.

Frustra-me, não posso evitar, que Nolan tenha tido o fim no ponto, e que não tenha evitado cair no óbvio, nem deixado de martelar uns favores comerciais. O seu Batman merecia ter sido perfeito até ao ecrã preto. Apesar de tudo, The Dark Knight Rises é mais um filme impressionante, e completa, com a altitude que se impunha, uma tão groundbreaking trilogia. No cinema de super-heróis, haverá, para sempre, o antes e o depois do Batman de Nolan.

8/10

domingo, 5 de agosto de 2012

O nosso feel good day nos Jogos


Não ganhamos nada, que se foda.

Mas durante 3 horas e meia o ténis de mesa foi desporto nacional, e estivemos a dois sets, jogados contra um campeão Olímpico, de eliminar a segunda melhor selecção do mundo. Foi o primeiro jogo de ténis de mesa que vi na vida, eu e uns muitos milhares de portugueses, mas vivi-o como um Mundial de futebol. Os Jogos são isto. Vermos as nossas cores pinceladas em mil e uma modalidades, que nunca vimos nem nunca gostamos, e sentirmos uma familiaridade pele de galinha, sentirmos que está ali uma coisa nossa, e fazermos daquilo uma coisa nossa, mesmo que estejamos em eliminatórias impossíveis, que não vamos ganhar. Enquanto eles estiveram ali, David contra Golias, estivemos todos, para o que desse e viesse. Há medalhas que não devem ter tido tanto orgulho como estes quartos-de-final.

Antes, a Jéssica Augusto foi fazer um brilhante 7º lugar na Maratona, e assinar o nosso 4º Diploma. Acabámos por ser a 3ª melhor selecção na prova, com 3 atletas nas 21 primeiras (Marisa Barros, 13ª, e a Dulce Félix, 21ª), só batidos pela Etiópia e pelo Quénia.

O pessoal da Vela, o Bernardo Freitas e o Francisco Andrade, consolidaram-se num espectacular 4º lugar da geral, com que devem encarar a Medal Race de 4ª-feira.

O João Costa, no Tiro, depois do Diploma que sacou no primeiro dia, ficou a uma décima de ir buscar mais outro. Até o João Rodrigues, nos seus sextos! Jogos Olímpicos, acabou num digno 14º lugar.

É amargo que só nos lembremos deles de 4 em 4 anos. Mas quando é a vez deles, é a nossa vez. Para os grandes, os Jogos são as medalhas. Para nós são esta comoção nacional, crer, uma sobre outra vez, que é desta que enganamos o destino. Talvez chegue a nossa vez. Se não chegar, a vontade de superação, nossa e deles, continua a ser olimpismo em estado puro.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

The Great Gatsby


A capa descreve-o como um romance que "evidencia as contradições do «sonho americano», a glória e a decadência do self-made man, a ambição e a busca desenfreada do dinheiro, a corrida em direcção a um futuro tão prometedor como ilusório." Para mim, contudo, o Gatsby não plasma assim tanto do nirvana do sonho americano. O que não o diminui. Ambiente que é incontornável à parte, é, para mim, acima de tudo, uma tragédia intemporal, com trama e vivências e relações perfeitamente contemporâneas, adaptáveis aos nossos dias. A época em que se desenrola só define o tom.

A história central é a de um homem fascinante mas do qual nada se sabe, Jay Gatsby, que, no Verão de 1922, vem abalar a cena nova-iorquina, ao tornar a sua monumental mansão num salão de festas diário, virtualmente aberto a todos quantos o quisessem frequentar. A acção, por sua vez, é narrada por Nick Carraway, um simples magistrado de classe média, que, vindo de Chicago, se estabelecera havia pouco em Nova Iorque, passando a ser, por obra do acaso, o humilde vizinho de Gatsby, de quem se vai tornar amigo chegado. Todas as personagens principais são fortes, e estendem-se, ainda, a uma prima distante de Nick - Daisy -, ao seu marido - Tom Buchanan -, e à sua melhor amiga - Jordan Baker. Nenhuma delas é especialmente carismática, mas são todas densas, por serem tristes, desiludidas e mais ou menos assombradas.

O livro retrata esse Verão quente, à medida em que a amizade entre as duas figuras centrais cresce, e Gatsby se dá a conhecer. A aparente aleatoriedade das venturas e desventuras desses meses, e as relações nos círculos em que Gatsby e Carraway se movimentam, é, então, progressivamente varrida. Emerge o passado, vem à tona os propósitos, e, enquanto a vida amarga destila ironias, precipita-se o seu corolário impossível.

The Great Gatsby não é um livro palpitante mas, como a própria História já lhe fez jus, é uma obra paradigmática, escrita com o pleno requinte de um artista. No fundo, é a jóia de uma Época que teve tanto potencial como oportunidades perdidas, assinada, num tom amargurado, por um dos maiores rostos dessa tal "Geração Perdida" americana, frustrada com o seu mundo de fingir. Não é um livro absolutamente surpreendente, mas é sempre venerável. Saliento-lhe, ainda, o potencial imagético. Nem sequer ao nível das descrições, mas da recriação de ambientes, da recriação de um Tempo: as festas, as casas, as pessoas, os sentimentos, o ar, tudo é fácil de se nos entranhar.

A grandiosidade de Gatsby é cinema em potência, pelo que as expectativas para o filme que chega no fim do ano são significativas. Já falei dele nos destaques do ano: "O australiano Baz Luhrmann (criador de Moulin Rouge) realiza e adapta o argumento, mas é no cast que está o deslumbre: Di Caprio protagoniza, naquela que parece ser, claramente, a sua grande aposta para os Óscares, e é acompanhado pela brilhante Carey Mulligan. Como secundários, os nomes consistentes de Tobey Maguire e Joel Edgerton."

A cartada para os Óscares sai a 25 de Dezembro.