segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

The Butler. Muita pretensão, alguma técnica, nenhuma alma


Os últimos anos foram especialmente prolíficos em filmes sobre o racismo nos Estados Unidos. Coincidência ou não, Oprah Winfrey esteve envolvida, directa ou indirectamente, em três deles: produziu The Great Debaters (2007) e Precious (2009), e protagonizou agora este The Butler. Coincidência ou não, todos eles são filmes fracos e todos padecem do mesmo mal: o retrato das condições, das injustiças e dos abusos é melodramático em vez de ser genuíno, é forçado em vez de ser inspirador.

As melhores coisas costumam ser sempre as mais naturais. Foi assim o excepcional The Help (2011), uma franca obra-de-arte, que trata as mesmas temáticas transversais com pureza, jeito e com uma emotividade honesta, em relação à qual é impossível não empatizar. O problema de The Butler, tal como o dos seus 'antecessores' nesta órbita de Oprah, é esforçar-se demasiado para que nos compadeçamos dele. O filme é feito para causar dó e para reafirmar dolosamente algo com o qual já todos nos identificamos, e não é assim que as coisas devem funcionar. Isso torna-o plástico, exaustivo e sem ponta de carisma.

A história até era boa. Adaptada de uma reportagem jornalística por Danny Strong, vencedor do emmy do ano passado para melhor argumento em mini-série, faz uma recriação livre da vida de Eugene Allen, que escapou dos campos de algodão do Sul dos Estados Unidos na juventude, para vir a ser mordomo da Casa Branca durante uns extraordinários 34 anos, entre 1952 e 1986. O primeiro defeito do texto é estrutural. Sendo um relato demarcadamente cronológico, não houve o indispensável engenho para moderar o efeito disso. Assim, o filme não se descolou de um prolongado martelar de datas (2h15 deste registo é um excesso), numa reafirmação de pontos de vista óbvios, sem surpresas para o sustentarem, ficando-se, em vez, por momentos falsamente emotivos que só o diminuíram.

É esse, aliás, o seu pecado capital: a pretensão. The Butler especula sobremaneira com a comoção, com os dilemas, com a grandeza moral e com a sua mensagem, ao mesmo tempo que nunca nos consegue contagiar para esse efeito. É um filme executado a regra e esquadro para ser um clássico, como mandam os livros, mas cuja absoluta ausência de alma o deita por terra. Lee Daniels, que já realizara Precious, faz um trabalho a que realmente não se podem apontar falhas de monta, mas que se torna redundante, na medida em que é sempre incapaz de fazer fluir a acção, maquilhar a passagem do tempo e, grosso modo, de nos manter interessados.

Se The Butler teve uma boa ideia, essa foi Forest Whitaker. Não que o oscarizado texano faça aqui um dos papéis da vida, mas porque é, de facto, quase impossível que este não esteja à altura do que lhe pedem. Não acho que tivesse um texto ou uma caracterização boa, nem que tenha tido nenhuma grande cena, mas, no global, tem uma performance muito sólida, que plasma, ela sim, a grandeza e a dignidade que se pretendia para o filme. Individualmente, é tudo o que há, apesar dos muitos nomes. Oprah não é qualquer mais-valia para o filme e, à semelhança do compadrio das aparições especiais de Mariah Carrey ou de Lenny Kravitz, que já se verificara em Precious, personifica pouco mais do que uma distracção. The Butler é um filme competente a nível visual, que recorre a um elenco extenso e a uma temática cara. Não sendo um desastre, a forma como se sobrevaloriza acabou por prescrever o seu falhanço.

5.5/10

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