terça-feira, 25 de junho de 2013

Exit Through the Gift Shop


É um documentário tão cativante quanto incomum. Exit Through the Gift Shop é um diário da origem do movimento de street art do início do novo século, mas é muito mais do que isso. Quase todas as filmagens em bruto são de um peculiar francês, então um perfeito desconhecido, que, desde novo, tinha a compulsão de gravar o seu dia-a-dia. Esse vício pelo registo de tudo durante o tempo todo levou-o, eventualmente, a encontrar um nicho: um primo seu viria a ser um dos percursores do movimento, e o que foi uma saída ocasional numa noite, para filmar aquela vivência e aquele trabalho, tornou-se numa gigantesca obsessão pela arte urbana que então começava a prosperar. Thierry Guetta viria, pois, a tornar-se num cronista do underground, convivendo com todos os nomes mais icónicos do movimento, viajando, inclusive, pelo mundo com eles e registando o seu trabalho, algo perfeitamente inovador já que, por definição, era tudo tão clandestino quanto secreto, e nada tinha alguma vez sido gravado.

A colecção de contributos que o francês reunia não parava de crescer, mas faltava-lhe, no entanto, chegar a um alguém em particular. Aquele que diziam ser impossível, inalcançável, secreto. Banksy, o maior de todos. Thierry tentou chegar ao lendário britânico durante muito tempo, por todos os canais que tinha cultivado ao longo dos anos, mas nada... Foi então que, por uma feliz coincidência do destino, quando já se tinha conformado, o encontro se deu, para sua verdadeira euforia. Absolutamente devoto à causa, Thierry veio a tornar-se num dos homens de confiança de Banksy, e no primeiro a alguma vez filmar o seu trabalho. O francês era, no entanto, bem mais do que um mero crente. A sua obsessão pelo meio, pela vivência e pelos artistas que seguia, o querer tanto fazer parte daquilo, na mesma medida da sua ingenuidade, fê-lo lançar-se a solo numa enorme exposição em Los Angeles. Mr. Brainwash viria a ser uma mistura exaustiva de todas as suas influências, sem critério e sem mensagem, uma espécie de cópia borrada e exagerada... que se tornou num sucesso de vendas na ordem das dezenas de milhares de dólares.

Partindo dos anos de filmagens de Thierry, quem realiza o documentário é, na verdade, o próprio Banksy. Alegadamente, o objectivo era ilustrar a história e a essência do movimento, mas, por força das circunstâncias, o trabalho veio a tornar-se, sim, num relato pessoal da história do gaulês... não sem derivar para uma crítica ácida àquilo em que ele se tornou. O documentário é extraordinariamente interessante. Tem um tremendo valor acrescentado pelas imagens "históricas" que consegue oferecer, mapeando o percurso de um movimento tão cativante, criativo, influente e efémero, mas o que o torna especial é a forma como passa a sua mensagem. Com despudor, carisma, ironia e sofisticação, o resultado final é uma surpresa.

No início, Banksy diz que, se calhar, até há ali uma moral qualquer que ele não admite ao certo, mas a crítica à vulgarização da arte e a sátira ao consumismo são brilhantes, e palpáveis na caricaturização de Thierry, um personagem que acaba por tornar-se enigmático. Há sempre um tom depreciativo em relação a ele durante o filme - um obcecado sem personalidade, sem noção das coisas, que só queria ter talento, só queria ter alguma coisa a dizer, que só queria fazer parte - e, no fim de contas, o seu Mr. Brainwash, tão grotesco... e tão bem sucedido, levantou mesmo o debate sobre até que ponto o francês não seria só mais uma criação, mais uma gloriosa ironia global, do próprio Banksy. O britânico garante que é tudo verdade mas, seja como for, Exit Through the Gift Shop é um documentário magnífico, sem nada de convencional, à imagem do seu autor, e que roça o génio na forma como elabora essa deliciosa crítica subversiva. Um must.

8/10

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