Aqui, mais do que os prováveis, há que teorizar sobre quem devia e quem merece. Orientemo-nos:
Filme
Vi os 10. Um ano depois, e uma nova luta a dois em perspectiva: The Social Network e The King's Speech saem em clara vantagem, e dificilmente não vão discutir entre os dois quem leva a estatueta para casa. Tal como no ano passado, não são, ironicamente, os dois melhores, e essa institucionalização, essa importância desmedida aos nomes, às modas e às escolas, continua a ser o mais intolerável dos Óscares. O favorito, ainda por cima, é o sensaborão The Social Network, que já levou o Globo de Ouro. Não me interpretem mal, porque The King's Speech é um filme de grande qualidade, e um dos melhores do ano: só não é tão bom como Black Swan e True Grit e, acima de todos, do que o extraordinário Inception. O filme de Nolan não é perfeito, nem sequer é o seu melhor, mas é dum campeonato tão à parte, que me choca profundamente a maneira como vai ser desterrado este ano (algo a que Nolan já se deve ter habituado). Mesmo sem hipóteses, vou continuar à espera do milagre até ao último minuto. Entre os outros dois, que ganhe O Discurso do Rei.
Actor
Faltou-me ver Javier Bardem. Colin Firth ganhou tudo até agora, é o largo favorito e, sem surpresas de última hora, será um vencedor justo. O seu desempenho em The King's Speech, emotiva e tecnicamente, só estaria ao alcance dos melhores, e o britânico provou, um ano depois de ter perdido o Óscar por entre as mãos, que é mesmo um dos maiores da actualidade. Ainda assim, para mim, o maior do ano voltou a ser Jeff Bridges. O que Firth consegue estilizar e interpretar, a Bridges sai naturalmente, e o seu carisma é incontornável. O californiano é o vencedor em título e, na curiosa reedição do duelo do ano passado, com Firth, torço por ele para o bis.
Actriz
Não vi Nicole Kidman nem Michelle Williams, mas, perante o autêntico festival de Natalie Portman, acho difícil alguém ter sequer estado perto. Finalmente Portman arrancou um papel para potenciar todo o seu talento, e o resultado final em Black Swan é absolutamente atordoante. Será o Óscar mais indiscutível da noite.
Actor Secundário
Vi-os a todos, e mantém-se a tradição da lista de Secundários de grande nível. Aqui também se adivinha uma luta a dois, entre Geoffrey Rush e Christian Bale, com vantagem para este último. Não é uma categoria onde tenha preferências muito declaradas: acho que era mais justa a vitória de Chris Bale, porque tem um papel icónico e mais exigente, mas, por outro lado, Rush é quase glamoroso, impossível de não gostar, e tem a vantagem de estar num filme globalmente bem melhor do que o de Bale. Fica em aberto. Nota para a justiça da nomeação de Jeremy Renner, e para o notável que é lá ter chegado, com um filme muito menos oscarizável.
Actriz Secundária
Só não vi a australiana Jacki Weaver. Melissa Leo é a grande favorita, e o estatuto é perfeitamente justificado: a interpretação plena de fôlego e abnegação é, com Chris Bale, o vulto dum The Fighter que passou ao lado. Merece menção a pequena Hailee Steinfeld (14 anos), que se passeia como uma grande senhora, entre os nomes graúdos de True Grit.
Realizador
Por muitos anos que passem, nunca vou perceber a razão porque Chris Nolan, depois de assinar um dos filmes da década, não mereceu estar sequer entre os 5 nomeados. Que não ganhasse, fossem os constrangimentos do sistema, mas não estar sequer nomeado é duma injustiça atroz e incompreensível. Com o génio de fora, torço por Darren Aronofsky, que também deu um verdadeiro tratado de realização em Black Swan, e cujo extraordinário devaneio criativo merece ser premiado. Infelizmente, o enorme favorito é, perceba-se lá porquê, Fincher e o seu trabalho tarefeiro, que está a uma unha da vitória com um filme grosseiramente banal, o que só deve envergonhar quem tem no currículo Se7en ou The Fight Club. Nota para a classe do trabalho de Tom Hooper, em The King's Speech.
Argumento Original
Vou bater nisto eternamente: The King's Speech, o grande favorito, é um excelente argumento, tal como The Kids Are All Right é bom, mas não consigo conceber como é que, numa categoria de argumento, se calhar mais do que em todas as outras, Inception se arrisca a ser tão desconsiderado. A superioridade para os restantes é quase violenta.
Argumento Adaptado
É uma vitória certa de The Social Network, num argumento sofrível, que mais não fez do que mastigar um bocado a moda, e investir em narrativas paralelas desinteressantes. Para mim, ganhava True Grit, não por ser um argumento particularmente especial, mas por ser um contribuinte sustentado para o excelente produto final.
As notas
Animação - num ano bem mais fraco para o género do que os anteriores, e com a vitória mais do que garantida de Toy Story, que nunca pôde vencer (quando saíram os dois primeiros filmes, a Academia ainda não tinha Óscar para Animação), reforço que o filme da Pixar tem mais de produto-ícone, do que de história de qualidade (a saga é muito inferior a quase tudo o que a Pixar fez depois). How to Train Your Dragon é um apontamento mais engraçado, e Despicable Me, esquecido, é a Animação mais interessante do ano.
Música Original - Adoro apanhar músicas originais daquelas que ficam, e If I Rise, de Dido a A.R. Rahman, da banda sonora de 127 Horas, é exactamente isso: para ficar. Tem de sobreviver à voragem da marca Toy Story.
No que sobra, oxalá o Inception se vingue, e leve tudo o que puder.