"I have no choice but to direct my energies toward the acquisiton of fame and fortune. Frankly, I have no taste for either poverty or honest labor, so writing is the only recourse left for me." Hunter S. Thompson
quarta-feira, 13 de março de 2013
House of Cards. Abram alas que é de culto
Nada mais, nada menos. Política produzida e co-realizada por um tal de David Fincher, e protagonizada por outro senhor chamado Kevin Spacey, reclamaria sempre todo o apetite possível. A verdade é que o piloto chega para deixar-nos convencidos. House of Cards tem um carisma quase palpável. É tão crua quanto charmosa, tão fidedigna quanto provocante, é pragmática, fria, negra e completamente contagiante ao mesmo tempo.
O background é a política feia, e recebe-nos com um "Welcome to Washington", corolário de um monólogo inicial brilhante. No centro da acção, está um Congressista com décadas de casa, presidente da Maioria, com poder e contactos acumulados, uma ambição borbulhante e preparado para dar finalmente o salto que há muito ansiava, rumo à Administração recém-empossada, após uma campanha que ele próprio orquestrou com mestria, para que nada pudesse falhar.
Frank Underwood (Kevin Spacey) é um homem verdadeiramente vultuoso e sanguinário, que sabe tudo sobre o jogo, sabe tudo o que tem de ser feito, mas que está ancorado num posto bem pior do que ele, à espera do momento ideal para dar o salto, e para ser o que realmente interessa. No último segundo, porém, puxam-lhe o tapete. Na Política, afinal de contas, as promessas e a lealdade são sempre relativas, e a corda rebenta do lado mais fraco... o lado fraco é que nem sempre é o mais óbvio. A série contará, pois, a maquiavélica vingança de Spacey, agora uma toupeira, um free agent determinado a implodir tortuosamente o Executivo, até que seja o próprio gigante a cair-lhe aos pés.
Beau Willimon, nomeado ao Óscar, no ano passado, pelo Argumento Adaptado de The Ides of March, foi o responsável pelo desenvolvimento da série. House of Cards respira política, está embrenhada no meio, mas perverte as fórmulas. Não tem o carisma emocional ou a lógica de grandeza de um West Wing, não tem nada de romântico; o que quer é destruir em vez de construir, tendo toda uma acção pessoalizada e mesquinha que lhe confere um ângulo sensacional. Funciona, obviamente, porque Kevin Spacey continua a ser autenticamente colossal, um ícone que nos brutaliza a cada cena, tamanha é a sua aura. Spacey é temível a actuar e a narrar, e é impossível vê-lo, e não achar que a sua ira será imparável. Escrever a história para um protagonista implacável não é novidade, mas, ao contrário de um Boss, outro exemplo recente de séries políticas, este protagonista não é o centro, está, antes, na sombra, e isso enegrece tudo para melhor.
Na lista de personagens, destacam-se ainda duas mulheres. Robin Wright é a Miss Underwood, e também é senhora de um poderio a toda a prova. Não é nem a mulher submissa que é enganada, nem a mulher viperina que joga nas costas; é o equilíbrio de forças exactamente ideal para o marido ("I love her, more than sharks love blood"). Kate Mara é, por sua vez, uma nova jornalista à procura de espaço na redacção de um grande jornal, que vai cruzar-se no caminho de Frank, e tornar-se numa ferramenta requintada para a sua agenda.
A série é uma adaptação homónima da BBC (1990), baseada num livro de Michael Dobbs. Tem a particularidade de ser um original da Netflix, um serviço americano de streaming, ou seja, a série não foi teletransmitida, sendo, na verdade, toda a primeira temporada (13 episódios) disponibilizada na Netflix ao mesmo tempo, no início de Fevereiro. A season 2 já está a ser produzida.
Mal lhe ponham os olhos em cima, não terão muitas dúvidas. House of Cards é o primeiro luxo de 2013.
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