É como ter 9 anos outra vez, e voltar aos lugares sagrados da velhinha Primeira Divisão. Não era Bwin, nem ZON, nem Sagres; era simplesmente a Primeira Divisão, e foi um sítio perfeito para se aprender a gostar de futebol. Os estádios não eram novos e não tinham 30 mil cadeiras em todas as esquinas. Também não eram perdidos da cidade. Ficavam-lhes no coração, o mais perto que desse das pessoas. Era o tempo em que havia mais gente do que lugares. Ou, pelo menos, parecia. Era o tempo em que era tudo mais simples.
Ver 14 mil pessoas a encher o São Luís é comovente. Lembro-me logo do Paco Fortes. Do Candeias, do King, do Carlos Costa, do Hajry. E claro, do senhor Nader, Hassan Nader, da época em que os mais pequenos também tinham símbolos, e também os podiam eternizar. É como se tivesse as cadernetas da Panini abertas nas mãos, como se pudesse vê-los a todos outra vez. Ou ouvir deles, claro, nos Domingos às 4 intemporais da Antena 1, enquanto esperava, fiel, por um golo do meu Marítimo. É como estar à espera de ligar a televisão, e de ter acabado de começar o Domingo Desportivo. E voltar a ver a nobreza do Vidal Pinheiro, a alma da Póvoa, a relva encharcada do Adelino Ribeiro Novo, ou toda a gente a acotovelar-se no velhinho Mário Duarte.
O futebol português perdeu tantas coisas desde esse tempo, muitas delas para sempre. É uma boa notícia que tenha podido recuperar o Farense. Do fundo mais fundo, até ao regresso que parecia nunca poder chegar, e 14 mil pessoas disseram presente. Oscar Wilde escreveu que viver é a coisa mais rara do mundo; a maioria das pessoas apenas existe. É o mesmo com os clubes. Não compensa toda a brutalidade do que se perdeu, mas acredito que quem esteve ontem no São Luís, tenha pensado que, se calhar, valeu a pena morrer, para poder voltar a viver assim. Como eu gostava de voltar a sentir esses Barreiros na pele.
O verdadeiro drama do futebol português é esse, é apenas existir. Há dias, porém, como ontem, em que ainda faz sentido. Um bem haja ao grande Farense, e toda a sorte do mundo. Só os maiores é que fazem falta.
2 comentários:
Mais um grande texto, como já é habitual. Realmente é um regresso que envolve grande nostalgia, sobretudo junto dos adeptos dos clubes pequenos e médios.
P.S.: Pedia apenas um texto sobre "Os dias em que o futebol português (não) faz sentido", em relação ao que assistimos esta noite nas bancadas do nosso Caldeirão.
Gosto muito dos teus textos,mas este ainda mais,sendo eu Farense por dentro e por fora.E sim,quando o árbitro apitou para o final,tive vontade de chorar.
Nuno
Enviar um comentário