segunda-feira, 8 de março de 2010

82ª - Balanço


Ainda que sem o fulgor e o glamour do ano passado, quando o Hugh Jackman partiu a loiça toda, foi uma cerimónia francamente interessante, para lá das críticas de desconsolo que insistem, todos os anos, em lhe fazer. Houve momentos muito bons, como o lançamento das categorias de Melhor Actor e Actriz, dos argumentos e, principalmente, de Melhor Banda Sonora, e, apesar de se ter desconsiderado a categoria de Melhor Música, perdido tempo a mais com homenagens, e despachado o Melhor Filme à bomba, o balanço é positivo. Os experientes Alec Baldwin e Steve Martin fizeram o que lhes competia e, mesmo sem deslumbrar (afinal de contas, como já disse, havia a sombra violenta da cerimónia do ano passado), construíram uma química muito interessante, superior, em ambiente, ao que o grande Jon Stewart, por exemplo, conseguiu há dois anos. Acima de tudo, é impossível achar a Oscar Night pouco apaixonante, com a passadeira e todos os velhos conhecidos ali, a aparecerem por todos os lados. Uma noite sempre obrigatória, diria, para todos quantos não resistem a este mundo.

Cool
Pessoalmente, vi a cerimónia, como já cá tinha escrito, a levar a peito as nomeações do Crazy Heart, e é óbvio que o duplo Óscar valeu festejo durante a madrugada. Talvez saiba um pouco a vingança, pelo The Wrestler, no ano passado, mas continuo a dizer que é, acima de tudo, o reconhecimento, mais do que justo, a um grande trabalho. E ainda por cima era a 5ª nomeação do grande Jeff Bridges. De resto, a nível das interpretações, não houve nenhuma surpresa desagradável, e, além dos garantidos Waltz e Mo'nique, também a Sandra Bullock não falhou, quando, a dada altura da noite, as coisas chegaram a parecer mal paradas, dado o fulgor de Precious. Também não posso deixar de sublinhar o regozijo especial por ter visto, surpreendentemente, o extraordinário Up levar um segundo Óscar para casa, depois da previsível vitória em Animação: foi banda sonora, e foi um mimo.

Not cool
Pior foi, desde logo, a única verdadeira surpresa da noite, que roçou a barbaridade: Precious roubou um Óscar encaminhado a Up in the Air, deixando, simplesmente, aquele que se arrisca a ser o melhor filme de 2009, perfeitamente a seco. Acho que qualquer pessoa que tenha visto ambos, percebe o que quero dizer: Precious é um drama violento, mas com muito pouco de argumento (o cliché da filha violada, imagine-se...), que só é um filme projectável pela qualidade das interpretações, apesar de, como escrevi na altura, só Mo'nique ser verdadeiramente boa (Sidibe é a sua aparência, nada mais que isso). Up in the Air, pelo contrário, apesar da riqueza a quase todos os níveis, é fruto dum texto eminentemente criativo, denso, que funde a complexidade da sociedade com a complexidade do indivíduo, dum ângulo, acredito, nunca abordado no grande circuito. Correndo o risco de derivar para as teorias da conspiração do costume, e quando não haviam hipóteses para Melhor Filme, Realizador ou Actriz (se bem que ainda temi pela Bullock, vá-se lá saber), parece-me que ter Oprah Winfrey como produtora é capaz de ser coisa para valer brinde. E depois do banalíssimo The Great Debaters ter chegado ao Kodak Theatre, no ano passado (sempre a estória da condição massacrável da raça negra...), o selo de Precious, este ano, parece coincidência a mais.

Nas outras grandes categorias (Filme, Realizador e Argumento Original), onde eu torcia por milagres em todas, só se assistiu a uma passagem esmagadora de Estado de Guerra, que as levou a todas para casa, e saíu como o indiscutível vencedor da noite. Repito que, para mim, The Hurt Locker não é o Melhor Filme do ano, e não tem, nem o melhor Realizador, nem o Melhor Argumento. Toda a luta dicotómica que se gerou entre si e Avatar, qual Espiral do Silêncio, a secar tudo à volta, é, até, provavelmente, o lado mais negro e menos respeitável da grande cerimónia que são os Óscares. É muito injusto que, com Up in the Air, District 9 e Up ao barulho, seja The Hurt Locker a ganhar ainda que, nessa luta pré-imposta com Avatar, fosse ele o vencedor natural. Argumento (destroçando The Inglourious Basterds e Up!), até é o menos admissível de todos, e Realização, aqui com o burburinho enervante de ser uma mulher a ganhar pela primeira vez, à laia de lobby da praxe, parece-me, igualmente, desajustado, tendo em conta o que o desprezado Cameron conseguiu, ao fim de 15 anos de trabalho.

De resto, foi um prazer, como sempre.

1 comentário:

Andreia disse...

A Mo'nique não se depila. Não se depila MESMO. Achei importante constatar