sábado, 29 de dezembro de 2012

Do facto da Premier League ser a melhor competição do sistema solar


Hoje vi seguidos o Norwich 3-4 City e o Arsenal 7-3 Newcastle. Isto de gente que jogou há três dias, e três dias antes disso, e que volta a jogar daqui a dois. Enquanto no sul da Europa quentinho o pessoal embala as malas na altura das férias da escola, vai para a terrinha ou para o Verão da América Latina, e tira uma semaninha de férias e só volta a competir a sério lá depois dos Reis, que a Taça da Liga é paneleirice, os tipos mais bem pagos do mundo, da liga mais mediática e assistida do mundo, têm de passar a Consoada a correr com a família e em gestão de esforço, que estão na fase mais exigente da época. Acham eles que faz sentido que, na altura do ano em que as famílias se juntam, em que vêm os filhos das Universidades boas e os tios do Sul e os primos da fronteira, e está toda a gente em casa, se aproveite para fazer jogos em não mais do que o limite do suportável pelas pernas, para que, naqueles dias, possam ir todos a jogo, logo depois da almoçarada em casa dos avós e imediatamente antes da jantarada nos vizinhos de sempre. E as pessoas lá aderem a esta ideia estapafúrdia, vá-se lá saber, de quem troca as férias saborosas por uma tournée em contra-relógio pelo país todo. E ainda por cima com aquele frio dos diabos. Raio de coisa.

Sinceramente, acho que se devia pagar um dízimo qualquer à Sporttv acima da quota do mês, quando estamos no campeonato de Natal. Não é decente desfrutar de tamanha coisa como se fosse o mesmo de sempre. Era justo, eu pagava. É que, reparem, não é só o facto daqueles jogadores todos se sujeitarem a 4 jogos no espaço alucinogénico de 11 dias; é jogarem com uma brutalidade tal de nível, de qualidade, de entrega, de disponibilidade, de cultura competitiva, de gosto pela bola, pelas pessoas e, acima de tudo, e sacrossantamente, por dar espectáculo, que é como se a época deles acabasse já aqui no ano novo, e não lá para os confins de Maio. Todo o planeta futebolístico devia ser obrigado a formar-se na Premier League. Uma espécie de licenciamento da UEFA, mandatório. Os miúdos, já nos infantis, deviam passar lá umas semanas. Os pais que começam a levar os filhos ao futebol, deviam ter logo x viagens pagas a Londres. A televisão estatal devia dar só jogos ingleses. E os nossos dirigentes deviam ter um tratamento estilo Laranja Mecânica, em mais doloroso, para verem que o futebol não tem de ser um espectáculo degradante de jogos sofríveis, equipas sem adeptos, estádios vazios e jogos à noite na semana. Como uma grande evangelização, umas Cruzadas do futebol.

Em Inglaterra, o jogo é cultural, e claro que isso não se pode copiar. Mais depressa voltavam a cair o Carmo e a Trindade do que tínhamos um boxing day. Também é económico. Eles são uma potência, têm poder, dinheiro, pessoas e jogadores que não tem quem quer. Mas acredito que é, acima de tudo, educação. A mentalidade educa-se, desde que existam condições para que o campo esteja tão próximo dos adeptos como deve. Num campeonato que até é impregnado de estrangeiros, o que faz a verdadeira diferença é a maneira como se escolhe estar, e a reciprocidade inacreditável que se escolhe ter para com o jogo e para com as pessoas. E isso só não aprende quem não quiser.

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