sexta-feira, 29 de junho de 2012

EURO, #16: Aconteça o que acontecer, foi um prazer, Azzurra


Alemanha-Itália, 1-2

Há selecções que nasceram para estes jogos. A Itália é uma delas.

Claro que a Alemanha era favorita. Andava a acumular credenciais desde 2006, foi a melhor selecção na África do Sul, e chegou aqui a ser o único rival da Espanha, dita à boca pequena ser a grande favorita do torneio. Ganhou o grupo da morte, ia para ser a primeira selecção a ganhar isto só com vitórias. O problema é que a Azzurra tem a mania das grandezas e é muito pouco impressionável.

A Alemanha puxou dos galões, entrou melhor. Tinha a final marcada, queria despachar rápido isso das formalidades. E podia ter marcado de facto, teve dois ressaltos a provocarem a linha de golo, um torpedo de Khedira e toda a sua força bruta instalada no meio-campo azul. Chegou a parecer questão de tempo. Chegou a parecer que era só estrelinha da Itália, que ia quebrar. Quando os alemães se deram conta, contudo, já estava 0-2.

Naquela primeira meia-hora, viveu a velha Itália. A equipa de Prandelli ainda não mostrara que tinha isso; é verdade que voltou a ser perdulária na segunda-parte, e que manteve a presa perigosamente viva, mas a senhorial cultura de vitória dos seus antepassados fez meia-hora em Varsóvia, e sancionou a mais do que merecida final. Hoje, a Itália de Prandelli transcendeu-se, foi a fusão dos dois mundos: primeiro resolveu, sem pensar muito nisso: depois jogou, de acordo com a sua nova matriz, como uma equipa que dá gosto, que desfruta da bola, e que destila superioridade técnica, estratégica, criativa e moral.

Como em 2006, a Mannschaft volta a ser arrasada numas meias-finais pela sua besta negra. Quando Lineker disse que o futebol são 11 contra 11 e no fim ganha a Alemanha, esqueceu-se imperdoavelmente dos italianos. A derrota não faz com que o Europeu da Alemanha deixe de ser bastante bom: um grupo da morte sem espinhas, 4 vitórias, futebol para mais na meia-final. É facto, porém, que não foi ao Leste a equipa incrível que deslumbrou na África do Sul. Se colectivamente a máquina não deixou de render, a nível individual notaram-se muitas baixas de forma, com consequências evidentes para a produção de jogo: Özil e Schweinsteiger chegaram estourados ao Europeu; Müller e Podolski, dois jokers importantíssimos, nem lá foram. Já Gómez, que à 2ª jornada tinha a Europa aos pés, é só um caso freudiano de desterro. A máquina mascarou bem, e Löw até começou a abrir a casa à gente nova com bons resultados. O problema da Alemanha é que a Itália estava em fato de gala, e, nesse caso, é sempre preciso ser muito melhor do que o normal.

Para mim, já é seguro dizer que a Itália foi a grande equipa deste Europeu. A Espanha que se cuide. Se nós esfolámos, a Azzurra vai para matar.

Itália - E da bruma, um monstro acordou. Tinha feito 4 jogos maus, falhou uma e outra vez, mais e menos escandalosamente, andou amarelado, andou no banco, era uma menos-valia para a equipa, um prejuízo. Prandelli, contudo, confiou sempre na brutalidade estapafúrdia do talento, e o talento entregou-lhe hoje uma final em bandeja de prata. Balotelli não tem meio termo: ou não presta, ou é genial. Não presta mais do que era recomendado. Quando é genial, não tem limites. O pontapé à Tsubasa no 2-0, a desolar no chão um gigante como Neuer, é uma das razões pelas quais o Europeu será lembrado. Num ápice, num jogo, super-Mario é o candidato número 1 a melhor marcador do Euro. É fantástico o futebol.

Ver Pirlo deixa-me com saudades. Com 33 anos, este será, muito provavelmente, o seu último grande torneio. Fico com pena de não ter visto todos os jogos do Milan, todos os jogos da Juve, todos os jogos da Itália. Nem consigo imaginar o que devo ter perdido. Pirlo é um génio, um poeta, um sobredotado. Cada toque na bola, cada decisão, cada compasso é um hino ao futebol. Pirlo podia ser catedrático, juiz do Supremo, supra-cirurgião. Devemos todos agradecer por ter sido jogador de futebol. É, possivelmente, o único futebolista que posso comparar em classe a Zidane, e é, aconteça o que acontecer, o melhor jogador do Euro-2012.

Da Azzurra, é justo destacar ainda a grande exibição da defesa. Portentoso Buffon, que terá provavelmente nas luvas o título Europeu; mas também Bonucci, com Pepe, os melhores centrais do torneio, e Chiellini, hoje a lateral-esquerdo. No meio, Montolivo não engana, é qualidade da cabeça aos pés. A abertura para o 2-0 é de génio. E no ataque, honra seja feita ao enorme Europeu de Cassano. Só marcou um golo, mas foi a vida daquele ataque os jogos todos.

Alemanha - Contra qualquer expectativa, Khedira foi o melhor alemão no Leste. Pareceu que estava a começar agora a época. Marcou, assistiu, carregou e contagiou a equipa. Já se sabia que era um jogador de força e de rendimento, se calhar não estava tão claro o que poderia fazer mais próximo do ataque. Fica à consideração de Mourinho.

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