terça-feira, 18 de setembro de 2012

The Wire (2002-2008), season 1


O pecado de muitas séries é não se colarem à realidade. Outras capitalizam a ficção, aligeiram-se. The Wire é crua como podia ser.

É uma série sobre o sistema, sobre a sua contaminação e inevitabilidade, sobre as suas inacabáveis defesas, uma série que é complexa, dura, pragmática e, por tudo isso, plenamente real. O que defende é que a única forma de fazer a diferença é sacrificar, perder, e continuar comprometido com o que se acha certo, mesmo que isso anule sonhos de subir na vida. Essa diferença é poder mudar um milímetro que seja, sabendo que, muitas vezes, nem isso se pode, porque a corrupção é imortal, e a guerra é para sempre. O ambiente envolvente, a vida pobre das pessoas em risco, é igualmente hostil, num retrato da imperfeição do mundo, que devemos tentar tornar melhor, mas que nunca poderá ser curado.

A acção é a da polícia de Baltimore, drogas e homicídios. O foco da temporada é a caça ao crime organizado, assente no tráfico de droga que emana dos bairros pobres da cidade. "Seguir a droga, leva-te aos traficantes, seguir o dinheiro, leva-te a todo o lado", este é o tom, e o que se consegue é por abnegação, por honra ao crachá de alguns poucos, por lealdade e por perdas pessoais, por entre a infinitude de paredes que o sistema, na sua sôfrega sobrevivência, levanta de todas as vezes.

The Wire tem muitas personagens muito boas, o que não é assim tão comum. O protagonista é McNulty (Dominic West), um detective totalmente inortodoxo e politicamente incorrecto, indisciplinado para a hierarquia, mas profundamente comprometido para com uma profissão que nasceu para ter, e para a qual está disposto a sacrificar tudo, progressão à cabeça. O seu par perfeito é Kima (Sonja Sohn), outra detective inatacável, polícia de enorme gabarito e enorme altivez profissional, com quem forma uma dupla indispensável, que se compôs de maneira feliz.

Entre muitos outros passíveis de destacar, os meus favoritos são Freamon (Clarke Peters), um polícia de inteligência e leitura prodigiosas, e Herc (Domenick Lombardozzi), um gigante rude e pueril, mas de grande integridade. Do "outro lado", há Omar (o magnífico Michael Kenneth Williams), um ladrão brutal que é um free agent, que não se alia e que é temido por todos. Mais Stringer Bell (Idris Elba), o cérebro e a imponência do crime organizado.

The Wire é uma série difícil, que não tem aquele romance que nos apaixona à primeira vista. O seu peso, contudo, é inatacável. Curiosamente, não teve nem enormes audiências, nem os grandes prémios da crítica. Desde que acabou, contudo, não há entendido que não a considere uma das melhores séries de todos os tempos.

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