Costa Rica 1-1 Grécia (5-3, agp)
Não sei se nalgum momento dos últimos 10 anos pensei realmente escrever isto mas, hoje, tive pena deles. Só houve uma equipa em campo a querer ganhar e a trabalhar realmente para isso, não porque foi obrigada, não porque teve de correr atrás do prejuízo, mas porque a isso se prestou desde o início, por honestidade e por convicção competitiva. Não sei se o percurso acidentado e a saída inglória lhe farão justiça mas, pese o seu ADN, todas as suas deficiências e o próprio preconceito generalizado, a Grécia deve ser lembrada como uma equipa que dignificou o jogo e que, não só mereceu chegar às eliminatórias, como devia ter estado entre as oito mais fortes. Os helénicos foram sempre positivos e foram melhores em três dos seus quatro jogos. Esqueçam tudo o que sabiam deles. Fernando Santos fez um trabalho notável com os recursos e a mentalidade que tinha à disposição e transformou a Grécia para muito melhor... só para vê-la ruir perante um adversário que usou os seus antigos segredos como um guião: muito esforço, futebol em metade do campo, um grande guarda-redes e um tiro de sorte, jogar em inferioridade e ganhar nos penalties. Nada pode ser tão irónico quanto o destino.
Não se pense que estou aqui a diabolizar a Costa Rica, porque isso jamais seria possível. Os ticos serão sempre a grande história deste Brasil. A equipa que nunca ninguém respeitou, mas que, do fundo do grupo da morte, chega a uns quartos-de-final após desterrar três campeões do Mundo e um campeão da Europa. Falaremos sempre deles com o carinho que eles merecem e a odisseia segue aí, viva. A minha única tese é que o futebol não pode ser dogmático, nem nos heróis, nem nos vilões. Na antecâmara, claro que teria sempre ratificado este resultado, mas jamais consigo ficar indiferente à competência. A relva é como o algodão, não engana. E, por mais que eu respeite a Costa Rica, hoje não era um papão que estava do outro lado, mas uma equipa real quanto baste, humana, uma equipa que merecia, pelo menos, alguma devoção de crédito. Depois do brilhantismo da estreia, tudo o que os homens de Jorge Luis Pinto tinham de fazer era sobreviver, a todo o custo, forjando a ferro e fogo que tinham nervo para levar as promessas até ao fim. Hoje, pelo contrário, era o dia para a Costa Rica voltar a jogar, voltar a ser alegre, voltar a mostrar porque é que nos conquistou. Seja por incapacidade, seja por mérito adversário, seja porque se convenceu do cinismo, não aconteceu.
Até ao golo pincelado de Bryan Ruiz, a equipa manteve-se a uma distância segura do jogo, especulando com as dádivas que ele lhe pudesse dar. Nunca pôs ideias em campo, nunca foi atrás da sorte. Quando a sorte por acaso lhe calhou, foi como se o jogo já tivesse acabado, o que só piorou com a expulsão de Óscar Duarte. A Grécia foi em crescendo. Carrilou sempre mais jogo, teve a única oportunidade da primeira-parte, sofreu contra a corrente e, depois, abateu um volume ofensivo em tempos inimaginável sobre o adversário. Os gregos têm um ataque algo primário, sem muita criatividade, mas com muita vontade e muito carácter. Sob todos os prismas, é difícil ficar indiferente ao que foram fazendo no Brasil, à valia da equipa e ao mérito de Fernando Santos. O golo nos descontos foi uma orgulhosa reminiscência muito sua, um vestígio do seu sangue perverso de tantas outras noites e, por uma vez, fez-lhes jus, deixando o cheque-mate suspenso no ar. No entanto, era só um presente envenenado. A Grécia ainda não deve ter percebido como é que não ganhou no prolongamento (24 remates contra 6, 57% de posse de bola...) mas, chegados aos penalties, só era, afinal de contas, o seu jogo para perder. Uma década depois de ter sabotado todos os que lhe apareceram pela frente, foi amoralmente no momento da redenção que a Grécia encontrou uma das suas mais dramáticas derrotas.
GRÉCIA - Holebas foi talvez o melhor lateral-esquerdo deste Campeonato do Mundo. Explosão, intensidade, técnica, um comboio verdadeiramente incansável com soluções técnicas de fazer inveja aos mais avançados. Brilhante. Lazaros, na extrema direita, foi o outro fórmula 1 da equipa. Com jogo de cintura e uma finta curta e objectiva, tem um pulmão insuperável e vende pragmatismo. Aos 37 anos, Karagounis correu 12km e encheu verdadeiramente o campo. A criatividade da juventude trocou-a pela maturidade táctica, pela capacidade de trabalho e pelos dons da construção a partir de trás. O capitão bem mereceu despedir-se de outra maneira. Muito bom jogo dos centrais também - Manolas e Sokratis - e peso sempre indiscutível de Samaras e das suas viagens menos ortodoxas pelo último terço.
COSTA RICA - A vitória tem um nome: Keylor Navas já era, com propriedade, um dos grandes guardiões deste Mundial. Hoje chegou-se verdadeiramente à elite, com duas defesas monumentais, a primeira a segurar o 0-0, a segunda a garantir os penalties que ele próprio viria a decidir, com a derradeira parada de ouro. Já dissera anteriormente que a Costa Rica pode não ter muitas individualidades, mas que tem a sorte das principais corresponderem. Hoje tal não poderia ter ficado mais claro, sobretudo quando a isto se juntou aquele bilhete delicioso de Bryan Ruiz.