sábado, 28 de junho de 2014

Mata-mata


Onze da primeira fase [3-4-3]:  

Ochoa (México); 
Rafa Márquez (México), Medel (Chile), Óscar Duarte (Costa Rica); 
Robben (Holanda), Herrera (México), Matuidi (França), James (Colômbia); 
Messi (Argentina), Benzema (França), Neymar (Brasil)

T: Miguel Herrera (México)

Parte da alma do Mundial acabou anteontem para a posteridade, na energia inenarrável dos três e quatro jogos por dia e dos 32 sonhos diferentes em campo. O Brasil 2014 tem sido um espectáculo ainda maior do que prometeu: um jorro de futebol inacreditável, regado com uma média de golos lendária, um lugar de jogos históricos, de surpresas irresistíveis e de filosofias que morrem, de uma identidade muito própria, o naufrágio europeu aos pés do Novo Mundo, e um palco de ídolos que chovem como ases. Perfeito. Agora que retomamos o fôlego, contudo, é hora de dizer que hoje começa outro Mundial. Outra face do planeta futebol, porventura menos eufórica, mas brutalmente mais intensa, os jogos de nervos em que cada segundo mata ou morre, na relva onde já não há segundas oportunidades. Agora só há lugar para quem falar a sério. Ficam as apostas:

Brasil-Chile. O Brasil vai ganhar mas só porque tem mesmo, mesmo de ganhar. Depois duma fase de grupos amorfa, a Canarinha teve o azar de encontrar de chofre um dos mais terríveis segundos classificados. O Chile fará a vida negra a Scolari - vai marcar, nunca se vai descompor e um prolongamento não está fora da mesa - mas, mais pela magnitude do contexto do que pela sua efectiva superioridade, o Brasil está condenado a seguir em frente. Nem os apocalipses podem ser prematuros.

Colômbia-Uruguai. Acredito que o destino do jogo se escreveu no momento em que a FIFA puniu Suárez como ele merecia. Claro que menosprezar o Uruguai seria um erro imenso e, se há um sobrevivente no Brasil, é o conjunto de Tabárez; sem o vampiro, contudo, a equipa fica desterrada e literalmente sem presas. Não me parece, por isso, que possa responder àquela que é uma das três grandes selecções do Mundial até agora. Menos experiente, menos agressiva e menos cínica, a Colômbia é, no essencial, uma equipa brilhantemente idealizada, senhora de uma monumentalidade de talento que parece desafiar quaisquer convenções.

Holanda-México. Declaradamente a tripla dos oitavos, pelo nível excepcional que ambos estão a apresentar. É, aliás, criminoso que Holanda ou México tenham de ir já embora. A Laranja é aquele 5-1. Tem um treinador de classe planetária, uma equipa equilibradíssima e dois génios na forma das suas vidas. Ainda vice-campeã em título, é quem tem mais responsabilidades e será a teórica favorita. Honestamente, porém, digo sempre que será um 50/50. Não há um parâmetro do jogo em que este México não seja excelente (capacidade defensiva, coesão táctica, pressão, dinâmica do miolo, golos) e, no resto, estamos a falar de um coração gigante em forma de equipa. Os mexicanos são mais inocentes mas igualmente mais intensos, talvez piores no ataque, se calhar melhores no resto e nunca, nunca vão desistir. É este o jogo que ninguém pode perder. E sim, voto México.

Costa Rica-Grécia. O feel-good game da eliminatória. Duas equipas que não deviam cá estar mas que, por honesta competência, merecerão cada bocado do seu lugar ao sol. Pela rodagem, a favorita é esta Grécia, diferente de outros tempos, sempre assombrante mas, hoje, a jogar mais do que se pensa. Seja como for, este não é, por certo, o Mundial dos estatutos e ninguém o provou mais ostensivamente que os ticos. Vencedores sem derrotas do grupo da morte, com um futebol quente e atraente, os homens de Jorge Luis Pinto são a lenda maior deste Brasil e acredito que será ela a subsistir.

França-Nigéria. Os campeões africanos terão o prazer de despedir-se frente a uma das mais espectaculares equipas do torneio e um dos sinceros candidatos ao título.

Alemanha-Argélia. Segundo take da conferência UE-África e necessariamente o mesmo desfecho, até ao titânico embate franco-alemão dos quartos-de-final.

Argentina-Suíça. Messi resolve, ainda que sobre alguma curiosidade para ver como é que a Alviceleste, com tanto provar, se comporta perante o seu adversário mais exigente até agora. A Suíça é uma equipa positiva e talentosa que pode sempre pregar uma partida mas, sinceramente, a derrota com a França parece feri-la de morte. Os alpinos mostraram-se, aí, terrivelmente macios e desequilibrados em desvantagem, com o resultado que se sabe, e nunca puderam criar o élan que se lhes antecipava. Mesmo com um treinador primário e cheia de interrogações, o talento individual e o calendário parecem condenar a Argentina a mais um final feliz.

Bélgica-EUA. Que as odds estejam sempre a seu favor deve ser o lema dos belgas. A equipa mais antecipada do Brasil 2014 foi presenteada com o grupo mais fácil da primeira fase e a verdade é que ficou-nos a dever o bilhete. Sem uma visão colectiva e sem autoridade sobre o jogo, sem um único momento de afirmação cabal, os belgas viriam a fazer o pleno com base exclusivamente no talento abusivo dos seus jogadores. Os oitavos antecipam-se como o enésimo episódio da série. Os Estados Unidos fizeram um apuramento digno, mas são uma equipa de demasiado baixo alcance para transtornar uma Bélgica infinitamente mais talentosa e, ainda por cima, moralizada. Os homens de Wilmots chegarão longe antes de terem realmente de provar alguma coisa.

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